13 ✧ ECLIPSE
Chloe se jogou do chão para a nave pulando e
entrando desesperadamente. Seus movimentos estavam rápidos, adrenalina correndo
em suas veias e seus olhos arregalados. O medo estava visível.
Brandon quis pilotar, porém Chloe pisou no
acelerador antes mesmo de sentar no banco. A nave flutuou por um momento e
partiu em disparada. Dei sorte que corri um pouco rápido e consegui entrar,
porque duvido muito que Chloe iria me esperar.
– Chloe – alertou Brandon e ela gritou um cala a boca e ele ficou paralisado.
Sentei-me no canto que estava quando fui salvo
pelos dois em Plutão e esperei a viagem acabar. O tempo passava devagar. Eu
tentava entender o que Chloe estava sentindo, não sabia se era agonia,
angústia, raiva, ódio, irritação, mas algo muito forte estava pairado sobre
ela. Eu também estava com sensações estranhas, agora, Sky estava em perigo e
estava se mostrando vulnerável para toda a galáxia, porém no fundo do meu
coração, eu sabia que parte disso era minha culpa. Eu sabia.
Chloe batia os pés na estrutura de metal da nave
com raiva e balançava as pernas.
– Brandon, tem água aqui? – perguntei e percebi
que não havia bebido água nenhuma vez desde que pisei na Lua. Era estranho. Eu
não sentia mais sede de beber água, de verdade, porém eu sentia que eu deveria
beber.
– Tem uns recipientes ali no canto – ele
respondeu e voltou a olhar para Chloe pilotando. Ele parecia aflito, como se
não confiasse a ela sua nave.
– Chloe – disse Brandon mais uma vez e ela
ignorou-o.
Levantei e fui até o final da nave. Havia um
compartimento lateral, puxei e vi litros de água. Litros e mais litros de água
gelada. Abri uma garrafa e bebi. O líquido desceu pela minha garganta e a
sensação foi maravilhosa. Beber água na Terra era bom, mas beber água no
Universo era melhor ainda.
– Estamos chegando! – anunciou Chloe.
– Chloe... – repetiu Brandon.
– O que é Brandon? – ela perguntou.
– Estamos sem combustível, agora, de verdade.
Chloe acelerou a nave, porém ela soltou barulhos
parecidos com um engasgo de bebê em questão de segundos. Nos três nos
entreolhamos e percebemos mais uma vez que não ia dar certo.
– Chloe, a Lua é seu território! – eu gritei
antes da nave parar completamente no vácuo.
Ela me olhou e achei que ela tinha entendido o
que eu tinha dito, mas não. Ela continuou me encarando e subitamente, a nave
desceu como descemos para a Terra na banheira.
Fomos jogados para o teto da nave rapidamente.
Bati minhas costas em uma estrutura de metal que doeu a coluna e comecei a
gritar. Brandon se agarrava no banco do piloto e Chloe gritava, berrava e se
debatia.
Seu rosto estava multicolorido, passando de
vermelho para roxo, depois uma espécie de azul amarelado. Ela deu um grito
final que arrepiou minha nuca, poderia ser muito bem alguém prestes a morrer
gritando de agonia, mas era só Chloe.
Senti uma pressão e a nave foi jogada para cima
novamente como uma bola de pingue pongue. Fui jogado para baixo e cai no chão
esticado. Chloe ainda gritava do nosso lado.
– Chloe! – berrei – calma, iremos conseguir! –
tentei acalmá-la.
Ela revirava os olhos. Fechava e abria os punhos
e batia-os no chão. Os dentes dela colidiam uns com os outros enquanto ela
gritava entre os dentes. Ela estava fazendo algo muito diferente, algo que
nunca tinha a visto fazer.
– Peter – chamou Brandon apontando para a janela.
Na pequena janela lateral da nave vi água. Água
na forma líquida, balançando e borbulhando. Achei por um momento que estávamos
submersos, mas não, não estávamos. Corri para a janela maior da frente da nave
e vi mais água sustentando e nos elevando para a Lua. Havia um rasto enorme de
água vindo da Terra, como uma enorme cachoeira espacial. Chloe estava
sustentando a nave com sua força das marés.
Arrepiei-me com o poder que Chloe possuía. Eu a
havia subestimado totalmente. Ela ainda gritava, porém agora estávamos mais
próximos da Lua.
– Vamos Chloe! – gritei em apoio.
Brandon me encarou com uma expressão de
desaprovação. Eu precisava passar o sentimento para ela que eu acreditava no
que ela estava fazendo. Eu precisava fazer com que ela pegasse minha empolgação
e transformasse isso em energia ou em poder para nos ajudar. Ela merecia isso.
– Só mais um pouco! Mais um pouco!
A nave subia rapidamente agora. Os berros de
Chloe estavam sendo abafados por longas e ofegantes respirações. Eu batia
palmas e a fazia acreditar que era possível.
Ela suavizou a expressão e a Nave caiu.
Olhei pela janela e vi uma grande rocha avermelhada,
cor de vinho, bem próxima ao vidro, do outro lado também. Estávamos onde eu e
Deimos tínhamos passado nos meus primeiros momentos na Lua.
O barulho agonizante de metal arrastando em
pedra me fez por as mãos nos ouvidos. A nave tinha agarrado entre as duas
montanhas: Monte Carpatus, lembrei o nome.
– Chloe – chamei dando tapinhas em seu rosto.
Ela abriu os olhos suavemente e piscou várias vezes olhando para mim.
Levantei para ir até a janela novamente para
encontrar algum meio de sair da nave, porém Brandon alertou:
– Não se mexa.
Olhei para o chão e vi que quando a nave tinha
sido pressionada pelas duas paredes de rocha, a superfície metálica tinha
rachado. Uma grande linha cortava a nave em duas separando Chloe e eu de
Brandon.
– Brandon – disse franzindo a testa.
Chloe acordou no canto e se mexeu. Virei o corpo
e antes de por a mão na boca significando silêncio, a nave partiu do meio e
descemos arrastando pelas paredes de rocha.
A linha que dividia a nave rachou completamente
e a parte de Brandon ficou solta, descendo mais rápido. Ele gritava
desesperadamente, sua expressão de medo era visível. Eu tentava me segurar no
chão e Chloe, que tinha acabado de despertar, estava incrédula com a situação.
Lembrei-me da única coisa que poderia nos ajudar
no momento: a pulseira. Toquei e pareceu que ela estava lendo meus pensamentos
e vendo a nossa situação. A bandeira se ergueu novamente em meu braço e com o
susto que tomei, joguei-a para Brandon.
Brandon abaixou-se desviando e a bandeira passou
e ultrapassou a estrutura de metal furando a entrada da nave e fincando-se na
rocha vermelha. A nave deu uma estancada forte levando Brandon para cima
novamente e descendo.
Estávamos na situação mais difícil até agora:
nossa nave, Chloe e eu, estávamos por cima da nave de Brandon e debaixo de nós,
o mare de silício corria violentamente.
– Brandon, você está bem? – gritei.
– Acho que sim! – ele respondeu – Estou agarrado
no banco, a nave está virada em quarenta e cinco graus e uma espécie de água
prata está encostando e derretendo o metal.
– É silício! Não toque! – berrou Chloe atrás de
mim.
– Se eu tocar, eu vou morrer? – perguntou ele.
– Não seja estúpido – ela respondeu.
– Mas tá quase nos meus pés! – exclamou – Há
alguma chance de eu ficar sem pernas ao menos?
– Não é hora de piadinhas Brandon – advertiu
Chloe e percebi que ela estava realmente preocupada.
– Vamos te ajudar, Brandon! Espera um momento –
decidi procurando um meio de descer para ajuda-lo.
– Não! – ele disse – Vocês precisam ir e salvar
Sky!
– Mas você precisa de ajuda – rebati.
– Mas eu não sou importante – a voz dele estava
melancólica como se ele tivesse sem esperanças de nada. Olhei para Chloe e ela
estava fitando o chão.
– Chloe, devemos...? – disse com a voz sufocada,
odiava situações assim onde me faziam escolher entre uma e outra opção.
– Sim – ela me interrompeu. Sua expressão agora
era de determinação, ela estava com os olhos fixos para as rochas vermelhas que
estavam em nossa frente – Vamos escalar.
Escalar rochas lunares não é o tipo de esporte
que ninguém deseja fazer. Sério, por um momento, elas possuem a consistência
que você realmente pensa que irá conseguir chegar ao topo, mas por outro
momento quando você as segura, acha que está segurando borracha.
De minuto em minuto, Chloe reclamava sobre
alguma coisa. “Eu nunca havia visto a Lua
desse jeito”, “Sky deve estar
correndo um grande perigo”, “Anda
logo, babaca” eram as mais comuns.
Chegamos ao topo arfando, deitei no chão terroso
e respirei forte umas vinte vezes, imitando a época que fiz natação no Brasil.
Indo para baixo da água, respirando e voltando calmamente. Senti meu corpo todo
relaxando, assim como meu coração parando de palpitar.
Chloe estava em pé olhando para o horizonte.
Virei o rosto e vi o grande prédio que era a Base, ainda lembrando o pentágono
americano, mas não nos seus melhores dias. Talvez lembrasse o pentágono no
mesmo dia do ataque terrorista de onze de setembro.
A base estava destruída. Toda a estrutura de
metal estava quebrada e jogada pela superfície lunar. Vários corpos jaziam no
chão, sacrifícios pelo ataque falso de Caronte. Todas aquelas vidas inocentes
tinham sido perdidas por uma pessoa. E ela iria pagar.
Chloe começou a correr descendo o monte.
Levantei e vi o quão inclinado era, desci devagar, mas ela descia furiosamente,
jurei ouvir gritos de agonia, mas nunca perguntei a ela se aquele momento ela
realmente estava fazendo isso.
Pisei em falso e caí rolando pelo monte. Meu
corpo doía e cada pedaço de rocha pequeno me furava enquanto eu descia sem
coordenação motora nenhuma.
Quando cheguei ao plano e parei de rolar percebi
que estava todo arranhado. Meu corpo todo doía e minhas roupas estavam
rasgadas. As pedras lunares realmente eram afiadas.
Chloe estava a alguns metros na minha frente
checando um corpo.
– Carter! Não! – ela berrava com o rosto no
peito do corpo do astro. Ele tinha fisionomia de uma estrela, porém como eu não
o conhecia, não disse nada. Mas assenti por dentro, todos os conhecidos de
Chloe e habitantes da Lua pareciam estar mortos.
– Chloe – murmurei.
Ela olhou para mim e seus olhos estavam
marejados de lágrimas. Seres do Universo podiam chorar e demonstrar sentimentos
também? Fiquei pasmo. Senti vontade de abraça-la. Andei pelos corpos, alguns
rostos eu reconheci do dia que cheguei à Base, mas outros não. Muitas pessoas
viviam aqui e agora não haveria mais ninguém.
– Está todo mundo morto, Peter – ela disse
olhando para os meus olhos.
Não soube o que responder. Lidar com mortes
realmente não era o meu forte, ninguém na minha família na Terra tinha morrido
ainda, porém ao pisar no Universo aquilo tinha se tornado comum, ou queria.
Primeiro Haro ao meu lado, meu pai morto há muito tempo e eu acreditando em uma
mentira, Austin, e agora todos os habitantes da Lua.
Virei o rosto e voltei a observar a destruição
da Base. Meu coração palpitou novamente quando vi uma sombra dentro do local
pela janela.
– Chloe! – alertei apontando.
Ela arregalou os olhos e saiu correndo pulando
alguns corpos aleatórios. Fui atrás.
Entramos na mesma porta que entrei com Deimos no
dia que cheguei à Base.
Estava tudo diferente. O chão ainda continuava a
grelha de metal, mas as paredes gritavam explicitamente o horror que tinha
acontecido ali: marcas de tiros, amassos e um líquido que jurei ser
sangue.
As luzes brancas no teto estavam piscando como
em um filme de terror, algumas estavam explodidas no chão, os cactos de vidro
espalhados no corredor. A claridade intensa tinha acabado.
– Apareça! – gritou Chloe pelo corredor e a voz
dela ecoou.
Algo fez barulho na Base. Não estávamos sozinhos.
– APAREÇA! – berrou e começou a marchar.
Neste exato momento, o som de uma sirene
explodiu nos alto falantes do corredor. As poucas luzes que estavam ainda
funcionando trocaram a coloração para um vermelho intenso.
– Desgraçado! – praguejou Chloe.
Na nossa frente, uma porta de metal desceu pelo
teto, e percebi que não era só aquela. O barulho era assustador, várias portas
estavam descendo ao mesmo tempo.
Olhei para Chloe e a única opção que nos restava
era correr.
Saímos em disparada, passamos por uma porta,
duas, três. Meu peito já pedia por mais ar, e tive a certeza que correr na Lua
não era algo legal para humanos, só havia corrido uns dez metros e estava
suando como se tivesse feito uma maratona inteira.
Ouvi um grito e parei subitamente de correr.
Chloe estava no chão e uma porta a prensava no chão de metal.
– Calma – gritei olhando para todos os lados
tentando achar algo que pudesse ajudar. As paredes não tinham nada e perto da
porta não tinham algo que pudessem fazer a porta parar de descer e reverter.
Coloquei a mão no pulso e lembrei que deixei a pulseira com Brandon prendendo a
nave no monte Carpatus.
Chloe gritava e batia com a mão no chão e eu não
conseguia pensar. A outra porta estava descendo também.
Um grito de desespero de Chloe eclodiu e a porta
explodiu. Fui jogado para trás no mesmo momento, caindo e deslizando pelo chão
metálico.
Chloe se levantou e estava irradiando uma aura
prateada. Seu cabelo estava bagunçado e seus olhos exalando poder.
– Eu que mando aqui – disse.
A outra porta já tinha descido totalmente. Mas
quando Chloe chegou próxima, ela subiu. Ela marchava pelo corredor e todos os
obstáculos pareciam respeitá-la e se curvavam. Era assustador.
Andamos pelos corredores e chegamos ao grande
local onde tivemos a primeira reunião. A maquete do sistema solar no teto
estava destruída, todos os planetas caídos no chão, a mesa transparente partida
no meio e também vários corpos. E sentado nos computadores digitando códigos
estava uma figura muito conhecida: Deimos.
A expressão forte de Chloe se desmanchou na
hora. Era ele. Tudo tinha sido causado por ele.
– Eu não acredito – ela disse e ele se virou
como se estivesse esperando esse momento.
Os olhos pratas de Deimos brilharam entre as
luzes vermelhas. Ele apertou um botão e a cor normal das luzes voltou: o branco
intenso.
– Bem vinda de volta, desbravadora – ele disse
com a voz arrastada.
Ficamos nos encarando por alguns momentos. Eu
estava suando de nervosismo. Deimos me cumprimentou com a cabeça e não
respondi.
– Como você pode? – disse Chloe batendo a mão na
parede – Cadê Sky?
Ele não respondeu.
– Como você pode, Deimos? Depois de tudo que
passamos!
– Que passamos? Ninguém nunca me tratou como eu
deveria ser tratado! – ele falou.
Chloe olhou incrédula.
– Te abrigamos e você nos trai assim?
Trabalhando para o Imperador? Suas palavras foram em vão?
– Trabalhe conosco também! – ele chamou – Alguns
já perceberam que a Via Láctea está perdendo credibilidade e quando o Sol virar
uma supernova, iremos todos morrer. Precisamos evitar isso!
– Não é por isso que você está se envolvendo com
Andrômeda, seu mentiroso!
– É um dos motivos!
– Você é um traidor! Maldito! – berrou Chloe.
– Minha querida, se acalme! Venha comigo, o
Imperador trouxe de volta para mim o que eu mais queria: o poder!
– NUNCA! – gritou Chloe.
– Você percebeu que há muitos corpos por aí,
sim? Muitos dos que viviam aqui já estão em nossa colônia, trabalhando conosco.
– Espiões – sussurrei.
– Primeira coisa que você, descendente diz de
sensato – senti o ódio por Deimos aumentando cada vez mais dentro de mim.
– E o que você ganha com isso tudo? – perguntei
ao perceber que Chloe estava tremendo demais para dizer algo.
– A minha salvação, meu caro – respondeu – Daqui
a alguns meses, Andrômeda e Via Láctea irão se colidir e se você quer saber,
ninguém é páreo para o Imperador.
Lembrei-me da história que Sol e Brandon haviam
contado. Era tudo verdade.
– E também trouxe a oportunidade de eu perceber
que não preciso de ninguém para viver. Fui expulso de casa, mas isso não
significa que perdi minha dignidade.
– Se você quer saber – a voz dela era trêmula –
você a perdeu agora.
– Eu não vou perder nada, só vocês irão – ele
disse e se levantou. Estava com uma roupa totalmente preta e não possuía nenhum
brilho como costumava ter.
Ele saiu correndo e o medo me bloqueou
totalmente. Fiquei paralisado e várias vozes eclodiram em minha mente, mas a de
Sol falou mais forte: “O que conseguisse
chegar a Plutão seria o escolhido e iria arruinar todo o plano de colonização e
deu uma missão para Deimos, esperar o descendente voltar e mata-lo”.
Deimos pulou por cima da mesa transparente
caindo próximo a nós. Ele levou o braço para trás fazendo o momento para dar um
soco em nós, porém Chloe me empurrou para o lado. Deimos atacou Chloe e os dois
se chocaram e uma pequena explosão ocorreu.
Deimos chutou Chloe e virou-se para mim. Eu
levantei e corri.
Não era muito esperto de qualquer pessoa fugir
de uma luta, mas eu não sabia o que fazer, e não sabia lutar, então o mais
prático para mim naquele momento fora evitar.
O berro de Deimos invadiu todo o local e todas
as luzes apagaram-se. Tentei localizá-lo, mas era impossível. Eu estava
perdido, por dentro e por fora. Era o fim.
Senti algo batendo em minha coluna e caí no chão.
Era ele. Ele subiu em cima do meu peito e me deu um soco no rosto. Não era só
um soco, vi em sua mão algo muito escuro, brilhando e mexendo-se.
– Peter – ouvi Chloe.
Eu precisava me defender, não podia apanhar.
Levei mais um soco e mexi a mão deferindo outro. Acertei algo duro: o rosto de
Deimos, imaginei.
– Maldito! – berrou Deimos.
As luzes ligaram e vi Chloe nos computadores e
Deimos caído no chão com as mãos no rosto. Ele se debatia e mexia as pernas
freneticamente. Do seu lado, Brandon estava em pé com a bandeira dos Estados
Unidos em sua mão e uma garrafa de silício aberta.
Deimos se virou e passou a perna em Brandon que
caiu no chão. Ele tirou as mãos do rosto e vi: Seu rosto estava se deformando.
Deimos se levantou para socar Brandon, mas me joguei em cima dele.
A adrenalina percorria em minha veia. Cai nas
costas de Deimos e ele caiu em cima de Brandon ao mesmo tempo. Brandon gritou e
pegou a bandeira e bateu no rosto de Deimos que estava se deformando. Ele se
debateu como um touro e me desprendi dele, voei pelo ar e caí em cima da
representação de Saturno na maquete.
– Eu vou te matar, descendente!
– Não vai mesmo! – a voz de Sky ecoou no
ambiente.
– Sky! – ele disse.
– Deimos.
Ele correu os olhos pelo local. Brandon estava
no chão caído com a bandeira no chão. Eu caído em cima de Saturno. Chloe
próxima aos computadores e Sky adentrando na sala.
Ele chutou Brandon e pegou a bandeira de sua
mão, e esfregou a haste na estranha escuridão que eu vi enquanto ele estava em
cima de mim, as luzes falharam novamente e todo o teto acima de nós explodiu.
As mais estranhas estrelas desceram flutuando
pelo ar, todos nós nos espantamos. Chloe se encolheu de medo e Brandon se
arrastou para trás se escondendo atrás de um armário.
– Andrômeda traz o recado: Iremos voltar – ele
gritou e lançou a bandeira na direção de Sky. O chão e o prédio rimbombaram e
as estrelas explodiram soltando fumaça negra.
Tossi e tentei ver algo balançando a mão no ar,
nada. Nem um palmo a minha frente eu conseguia ver. Ouvi somente um gemido e um
corpo caindo no chão. Do outro lado ouvi outro.
– NÃO!
Engoli em seco. O pressentimento tomou conta do
meu pensamento. Tínhamos falhado.
Chloe explodiu novamente e a luz intensa
iluminou todo o local e vi a cena. Sky estava caída no chão com as mãos no
peito. A bandeira dos Estados Unidos estava dentro de seu corpo, passando de um
lado a outro. Chloe correu desesperadamente e se jogou do lado de Sky.
– Não, não pode ser.
Sky olhou com piedade para Chloe.
– Chloe...
Chloe tentava tirar a bandeira do corpo de Sky,
porém não saia. Levantei de cima de Saturno e fitei o chão. Não queria ver mais
uma morte.
O choro de agonia de Chloe doía meu coração. Sua
irmã estava morrendo em sua frente e não podíamos fazer nada. Morrendo por
culpa de alguém que confiaram por tanto tempo, cuidaram e abrigaram. Elas e nós
estávamos de mãos atadas e surpresos com o que tinha acontecido.
– Agora eu consigo ver – dizia Sky, mas Chloe
não a deixava terminar a frase.
– Você não vai ver nada – relutava Chloe – Vai
ficar aqui, comigo.
A mão de Chloe tocou a mão de Sky e ela levou a
mão da Imperatriz Lunar em seu rosto.
– Eu consigo sim – disse entre gemidos – Está
tudo claro, irmã.
– Não – a voz de Chloe era fraca, triste e
desesperadora.
– Chame elas – ela pediu.
Sky pedia pelas plêiades.
– Eu não vou chamar. Não vai ser necessário! –
relutava Chloe.
– Peter... – pediu Sky.
Chloe olhou para mim e seus olhos estavam
vermelhos, lágrimas desciam e seu nariz estava entupido. Eu me senti paralisado
novamente. A decisão tinha sido posta em minhas mãos. Queria virar e fugir, mas
não podia. Se esse era o desejo de Sky, assim eu faria.
– Que as estrelas sempre a acompanhem – eu disse
baixinho.
O brilho forte vigorou e iluminou todo o local.
Brandon apareceu ao meu lado quando as jovens meninas azuis desceram pelo teto
de vidro quebrado. A aura angelical deveria nos acalmar, porém a situação não
era propícia para o momento.
Chloe se levantou chorando, fraca e abraçou
Brandon escondendo seu rosto do que estava prestes a acontecer.
– Plêiades, levem esta jovem Lua de volta para o Universo
e clame por justiça – disse.
As plêiades estudaram Sky, e soltaram um
cochicho que eu não entendi, porém Sky conseguiu. Ela acenou com a cabeça e nos
chamou para perto.
– Chloe, você foi a irmã que eu sempre pedi –
ela dizia com dor na voz – Mil perdões pelas nossas brigas, nossos momentos que
não conseguimos nos entender e por eu ter um dia segregado você da minha parte.
Saiba que nunca tive a real intenção de te rebaixar ou de te expulsar da Lua,
até porque ela é sua. Agora é sua. Nossa divisão de lado claro e lado escuro
não acaba agora, porque ela nunca existiu – e parou para respirar por um
momento – Eu te amo. Guarde bem nosso lar.
Chloe soluçou. Era a cena mais triste de todas
que eu já tinha presenciado na vida.
– Brandon, eu sabia que seu papel era decisivo
nessa jornada. Agradeço a você por ter salvado Peter, e você não estava louco,
tudo é verdade. Eu a vi.
Brandon assentiu. E Sky olhou para mim.
– Peter, eu sei que você será um ótimo guardião,
mas não se esqueça dos verdadeiros aliados. Não acredite em nada que te
disserem a não ser que você consiga ler sobre isso antes. Você irá nos salvar,
esperei tanto tempo por alguém como você.
Respirei forte. Não sabia o que responder, e
entendi que o silêncio é a resposta mais concisa para estes momentos.
– Meu avô vai me cobrir no meu último suspiro –
ela disse apontando para a janela.
Da parte que consegui ver da janela, o universo
parecia triste. A terra em nossa frente tampando a Lua, apagando ela
totalmente. Estava ocorrendo um eclipse lunar.
Ficamos em silêncio por um momento e assim que
voltamos, Sky tinha fechado os olhos. Chloe soluçou e pôs o rosto em meu ombro.
Sky tinha ido, mas eu não deixaria Chloe ir também. Uma lágrima brotou em meu
olho e tentei segurá-la, mas não consegui.
As plêiades dançaram no ar irradiando um brilho
azul e o corpo de Sky começou a se difundir no ar, assim como o de Haro. O pó
colorido brilhava tão forte que todos nós fechamos os olhos.
Com os olhos fechados imaginei o que estaria
acontecendo nesse momento se eu tivesse ficado na Terra. Não teria me envolvido
em nada. Ninguém teria morrido, forças contrárias não estariam atuando dentro
como espiões. Parte disso era exclusivamente minha culpa, e eu sabia.
Não tinha porque dizer nada naquele momento, não
tinha porque discutir sobre um futuro incerto. O universo tinha se desalinhado,
tudo tinha saído dos trilhos, não havia nem como dar uma olhada em volta, pois
tudo estava errado, a função que um exercia há alguns dias, não exerce mais
agora. Prometi a mim mesmo naquele momento vendo o corpo de Sky se desvanecer
que não teria sido em vão. Nada iria nos impedir de continuar lutando pela
nossa casa, a Via Láctea.
Continuamos ali no chão depois que o corpo de
Sky se fora e somente o que sobrou foi a pulseira, que coloquei em meu pulso
novamente. Chloe abraçou Brandon e depois eu. Ela tremia de tristeza. Tentamos
acalmá-la, mas quanto mais o tempo passava, mais pesado o clima ficava.
E assim ficamos por um bom tempo, ajoelhados,
cheios de tristeza, nervosismo, fraqueza e chocados com a morte de Sky,
esperando o eclipse acabar.