9 ✧ INVASORES
Quando Halley se transformou em sua forma de
cometa, fiquei maravilhado. Ele era muito maior do que Ison e mais brilhante
ainda. Fiquei com vergonha e com medo de subir em um cometa, então esperei
Chloe ou Austin fazer isso primeiro para certificar que nada errado iria
acontecer. Nada aconteceu e me senti livre para sentar. Era como estar em uma
cama. Era plano e fixo, não teve ameaça de cair enquanto subíamos pelo céu, e
aos poucos, Vitória foi virando somente uma cidade tão pequena que percebi que
ultrapassamos a atmosfera e que o céu escuro começou a surgir novamente.
– Espero que ninguém tenha te notado, senão
mudaremos toda a ciência – comentei para Halley e era verdade, não sei quanto
tempo ele tinha antes de voltar, mas adiantamos tudo isso. Imaginei cientistas,
estudantes de astronomia loucos pela volta de Halley sem que ninguém ou a
tecnologia tivesse previsto, livros e conceitos sobre teriam de ser mudados.
– Geralmente eu apareço em intervalos de setenta
e cinco anos, mas queria ficar de verdade por lá – ele disse – A Terra é tão
organizada e de todos os locais que passei, foi o que eu mais gostei.
Lembrei-me de meu conceito de estar sozinho já
tinha sido quebrado há dias. Desde que vi todas aquelas pessoas na Base, mais
os guardas em Mercúrio, a cidade em Vênus, tudo isso ainda estava sendo
processado, mas estava sendo aceito sem muita relutância de minha parte. Por
que ignorar que estamos sozinhos? Que a Terra é a única que possui habitantes?
Eu costumava pensar assim, mas hoje em dia, revisei toda essa teoria.
– Seu pai está furioso – voltou a dizer – Se eu
fosse você, estrelinha, ficaria por aqui ou procuraria outra galáxia.
Olhei para Austin e sua expressão não mudou nem
um pouco. Ele estava ligando muito pouco para seu problema com seu pai pra se
importar.
– Não quero nem saber – disse Austin – Nunca
mais voltarei a ser uma estrela, agora eu que não quero mesmo.
Permanecemos em silêncio por boa parte da
carona, Halley era muito rápido, então em questão de segundos estávamos próximo
à Vênus, mas não paramos porque meu plano era de parar na volta para a Lua, que
brilhava agora como um ponto atrás de nós.
Apesar do pouco tempo, a sensação de estar
novamente no Universo me animou um pouco e me deixou mais tranquilo. A minha
mente traduzia para que aquele fosse um lugar seguro e brando.
– Vamos precisar parar em Mercúrio, estou
cansado – disse Halley – E vocês são pesados.
Vi Mercúrio em minha frente e me impressionei em
como chegamos tão rápido. Halley tinha usado outro caminho, sem ser a via das
Irmãs Três Marias, talvez por ser um cometa ele tivesse benefícios maiores.
Halley se aproximou do planeta e fez um giro no
ar, jogando nós três, despreparados, no chão arenoso. Cai e rolei por um tempo
e ouvi-o rindo adquirindo velocidade e voando.
– Maldito – praguejou Chloe.
– E agora? O que vamos fazer? – perguntei.
– Achar algo que nos leve à Plutão.
Localizamo-nos em outra parte de Mercúrio que
ainda não tínhamos visto. O chão agora era areia pura, como um deserto e a
ardência do sol escaldavam em nosso corpo. Usei a pulseira rapidamente para me
proteger e continuei andando. Às vezes a areia trocava de cor, de amarelo-ouro,
ia para preto, cinza e por fim, tudo pareceu uniforme como saibro.
– Santa Galáxia! Não vamos nunca sair daqui? –
disse Austin secando suor de sua testa. Não sabia que estrelas podiam suar.
– AUSTIN! – berrou Chloe.
Os dois arregalaram os olhos um para o outro.
– Eu estou suando! – bateu palmas – Até que
enfim!
Austin comemorou, batendo palmas, rindo e
fazendo gestos com os braços. Ele parecia muito alegre. Olhei para Chloe e nem
uma gota saia dela. Austin suava tanto como eu estava suando dentro da proteção
concedida pela pulseira.
– Não estou entendendo – disse.
– Austin está finalmente virando humano! –
anunciou Chloe.
– Como assim? Austin é uma estrela!
– Era, meu amigão – ele disse rindo – Lembra do
que eu disse quando nos conhecemos? Uma estrela em fase de transição.
Lembrei-me de Austin na mesa na Base. Onde
estávamos todos reunidos para discutir o problema que estava acontecendo no
Universo. Austin, Chloe, Sky, Haro e Herbig, Deimos, e Lucy.
– Como isso é possível? – indaguei.
– James me ensinou – ele respondeu.
– Isso é mentira – disse Chloe dando um tapa no
braço de Austin que deu um grito.
– Quem é James?
– O descendente de Júpiter.
Chloe murmurou “Mentira” e Austin fechou a cara.
– Ele existiu ok! – ele berrou.
Chloe o olhou e riu. Percebi que Austin tinha se
irritado mesmo com Chloe não acreditando nele e na história de Jones.
– Olha aquele ponto azul ali atrás do sol –
disse Austin – São eles!
Há uma distância considerável de nós e do sol,
havia Plutão, brilhando como uma estrela azul.
– Eles são meio burros né? – disse me lembrando
das minhas aulas do ensino fundamental – Estão se matando, olha o sol derretendo-os.
– Eles são
burros – confirmou Chloe com desprezo.
– Como chegaremos lá? – perguntei.
– Não faço ideia, se continuarmos andar aqui,
nunca vamos achar nada.
– Vocês são seres do Universo, não possuem
poderes não?
Chloe e Austin riram. Os dois bateram palmas
desesperadamente tendo crises de risos. Me senti um idiota perguntando isso.
– Por que vocês estão rindo?
Eles continuaram.
Sentei-me em uma rocha que vi em minha frente
com a cara emburrada já que os dois estavam me fazendo de bobo e senti meu
celular. Meu celular. Tele transporte. Sky falando comigo enquanto eu estava no
almoxarifado.
– Já sei o que iremos fazer! – disse eu, por
fim. Peguei meu celular e senti que ele estava seco, agradeci aos astros
internamente, pois após a queda no mar em Vitória achei seriamente que ele
queimaria.
– Qual o código de Plutão? – indaguei.
Chloe me encarou e franziu a testa. Ela estava
séria agora, não estava mais rindo, suas bochechas enrijeceram e sua boca ficou
dura. Encarei-a de volta e tentei descobrir qual era o problema em perguntar o
código de um Planeta.
– Não existe, Peter – intrometeu-se Austin antes
que ela respondesse.
– Obvio que sim! Eu consegui ir para a lua,
então é obvio que o código funciona em toda a Via Láctea, não?
– Não – disse ele rapidamente.
– Mas ele já foi um planeta...
– Já foi! – respondeu Chloe, duramente – Já foi,
agora não é mais. O código é só para alguns locais. Ninguém sabe interpretar
esse código direito, Sky demorou milênios para entender o código da Lua e não
conseguiu achar nenhum outro que funcionasse.
– Mas...
– Mas o que? Você acha que você vai entender o
código com sua experiência enorme aqui na galáxia?
Austin pôs a mão no ombro de Chloe, que percebeu
que estava gritando. Ela olhou para o chão e respirou fundo. Via-se claramente
que ela estava se irritando, não sei porque, mas sim, ela estava se irritando.
Me virei e voltei a mexer no meu celular, com o
discador aberto, lembrei-me do código da Lua: *2#. Pensei por um momento.
– Ele me irrita as vezes e me lembra ele – dizia
Chloe atrás de mim e Austin fazendo sons com a boca de negação.
Asterisco, dois e jogo da velha. O que isso
tinha em comum? A lua, o satélite
natural, a Terra, o planeta e esses caracteres avulsos.
– Calma Chloe, esquece tudo isso – num tom
sereno, Austin tentava acalmar Chloe que estava irritada por nada.
A terra, terceiro planeta. O código, três
caracteres. A Lua, a segunda parte da Terra.
Digitei: *1#.
Apertei o botão de ligar.
A tela não mudou como na primeira vez, agora, um
solavanco no estomago me fez fechar os olhos de vez. Senti tudo dentro de mim
remexendo, o ácido dentro de mim queimando e balançando. A sensação foi
péssima.
Abri os olhos e vi tudo diferente.
A sensação gelada do Universo tinha acabado com o
Sol que batia em meu rosto. O vento brigava com a sensação de calor, os dois
disputando quem iria prevalecer em mim. Em cima de mim, palmeiras verdes
balançavam em harmonia. Pássaros cantavam no fundo, e o som de onda quebrando
em rochas era maravilhoso. O ar era leve, com um leve cheiro salgado, e tudo
pareceu por um momento o local mais perfeito do mundo. Andei por um pouco pela
areia branca e me localizei em uma praia muito bonita. Caranguejos andavam pelo
chão saindo de seus buracos e algumas pessoas estavam deitadas em cangas.
Embaixo de uma palmeira, um homem moreno,
robusto e com vários apetrechos em seus braços tocava um tambor. Ele parecia
feliz, com os olhos fechados e apreciando o ambiente.
Esse era o código. A Terra, o terceiro planeta,
três dígitos. Mercúrio, primeiro planeta. Um dígito.
Apertei * e fechei os olhos, querendo que eu
estivesse certo.
A sensação foi a mesma. Logo, eu estava em pé na
terra arenosa de Mercúrio e Chloe e Austin gritando meu nome desesperadamente a
alguns metros.
– Estou aqui – chamei-os – Entendi o código!
Chloe me
mirava com os olhos, incompreendida que consegui realizar algo que ela parecia
ter certeza de que estava certa. Ela veio marchando como um soldado de guerra
em minha direção com a cara emburrada.
– Você é sortudo, só isso – assentiu.
– Eu sou esperto – rebati.
– Não tanto.
– Ok, vamos ao que interessa? – interrompeu
Austin – Precisamos ir a Plutão cortar o maldito elo, lembram?
– Sim, encostem-se em mim – disse.
Os dois tocaram minha pele e pela primeira vez
percebi o quão gelado ambos eram. Os dois viviam no universo, então esse
deveria ser o motivo. Passou pela minha mente que eu não sentia mais frio e nem
percebia que não ventava como na Terra.
– Que demora – murmurou Chloe impaciente no meu
ouvido.
– Estou indo – peguei meu celular e pensei por
um momento. Plutão era o nono planeta do sistema solar, então o código dele
eram nove asteriscos.
Digitei.
A sensação ruim bateu novamente, a emoção de se
transportar pelo Universo não era nada atrativa, e prometi a mim mesmo naquele
momento que só a usaria em últimos casos.
Abri os olhos e pisquei várias vezes para
acostumar com o local. O chão era rochoso, mas coberto por uma grossa camada de
gelo, que lembrava os lagos congelados de Washington. Havia grandes picos
glaciais que me recordavam icebergs.
A nossa frente um muro gélido de uma grande metrópole se erguia e muito no
fundo, um castelo enorme rochoso.
Estávamos mais próximo do Sol, eu já o sentia penetrando
pela camada de proteção dada pela pulseira. Olhei em volta e vi em cima de uma
grande torre dentro da fortaleza uma construção estranha: algo parecido com uma
roda gigante enorme e no local de cada banco, estava um cabo de aço. O elo,
pensei. Porém não tinha ligado a nada.
– Vocês estão vendo o mesmo que eu? – perguntei.
– Sim – disse Chloe – O que é isso?
Austin deu um grito e caiu no chão gelado, olhei
para trás e me protegi enrijecendo e fechando as mãos em posição de ataque,
pois da superfície surgia algo estranho. O chão borbulhava como água fervente e
fazia um barulho estranho. A água flutuou por uns centímetros e começou a
tornar forma. Em poucos segundos um homem de uma estatura de uma criança se
materializou em nossa frente. Ele era certamente o ser mais diferente que eu já
tinha visto até agora: Era azul. Todas as partes do corpo eram azuis. Cabelo,
pele, olhos, boca, língua, tudo.
– Invasores! – disse ele e sua voz era fina,
muito fina que senti vontade de rir.
– Não! – interviu Chloe – Não somos invasores,
sou Chloe, desbravadora da Lua, satélite da Terra.
Austin soltou um grito abafado, enquanto o
habitante de Plutão não aguardou um segundo e começou a gritar:
– INVASORA! INVASORA!
Chloe deu um passo para trás e eu fiquei parado.
Aprendi na prática que cachorro bravo não vai atrás de quem está parado, talvez
funcionasse com habitantes de Plutão.
Em segundos, o chão tremeu e vários nativos
surgiram, eles traziam em suas mãos agora arpões e nós três nos encolhemos no
meio da roda que havia se formado. Os plutônicos gritavam uns para os outros e
o primeiro que nos encontrou tinha se perdido na multidão de habitantes
idênticos.
– O que aconteceu? – perguntei aos dois que
encostavam suas costas nas minhas.
– Se tivesse um código para se ferrar em Plutão,
digamos que seria “Terra” – respondeu Austin.
Lembrei-me da história de Plutão deixar de ser
um Planeta. Quem o deserdou foi o pai de todos, Sol, como Sky disse, porém quem
deu mais apoio foi a Terra e todos seus habitantes. Realmente, estávamos
ferrados.
Um habitante encostou a ponta do arpão em minha
pele e queimou. Não queimou porque era quente, mas sim pela temperatura gelada
que estava. Abaixo dos trezentos graus negativos com certeza. Soltei um gemido
e ele berrou me imitando.
– Cala a boca! – gritou Chloe e ela levou uma
cutucada de arpão de outro, deu um pulo e saiu correndo.
Os plutônicos azuis ficaram loucos. A raiva
estampou seus rostos enquanto Chloe corria em direção ao portão da fortaleza
gelada. Eles berravam e faziam sons que eram incompreensíveis e tentei entender
porque eles eram assim, não consegui.
– E agora? – perguntei a Austin, mas ele não
teve tempo de responder. O chão tremeu de novo e todos os plutônicos pararam de
correr. O local onde estava borbulhando no chão brilhava e nisso, todos os
seres azuis se ajoelharam no chão e abaixaram a cabeça.
A água não se materializou primeiro como os
outros, o homem surgiu como mágica, do nada. Quase dois metros, cabelos pratas,
pele clara e olhos azuis. Usava um terno azul marinho, calça preta e sapatos.
Jurei que ele era um empresário. Em sua mão havia um arpão enorme prateado que
modificava de forma toda hora, indo de arpão para algo parecido com cabo de
vassoura, após um momento transformou-se em um bastão de beisebol. Austin e
Chloe gemeram quando o viram. Ele parecia firme demais, como um pai que estava
bravo. Forcei a mente para tentar lembrar, mas um ser azul disse alto:
– Vossa Majestade, Plutão.
E tremi quando ele terminou de dizer e Plutão
tomou uma expressão rígida em seu rosto frio.
– Quem são vocês? – a voz grossa dele ecoou em
meu ouvido. Era algo tão estranho, ver e ouvir algo de tão distante, parecia
antigo demais e dava medo.
– Sou Chloe Selene, desbravadora da Lua, este é
Austin Orion, estrela em transição e aquele é Peter... –e ela olhou para mim
esperando que eu me apresentasse.
– Peter Allister, descendente da Terra –
completei.
Plutão me estudou por um momento. O silêncio
pairou e o encarei de volta. Ele não tinha ficado impressionado quando Chloe
tinha dito que era da Lua igual seus habitantes, mas tinha ficado muito quando
eu disse que era descendente da Terra. Devia ser outro código para não se dizer
em Plutão.
– Interessante – ele disse friamente – O que
devo a honra de uma raça que sumiu há séculos?
Olhei para Chloe tentando entender o que ele
tinha dito com uma raça que sumiu há
séculos. Será que eles não sabem que os humanos estão vivos há milhões e
milhões de anos? Ela desviou o olhar e senti que aquilo deveria ser feito por
mim, como se tudo aquilo tivesse ocorrido porque eu aceitei ir, e de certa
forma, era minha responsabilidade.
– Nós viemos cortar o elo – respondi.
Plutão e os habitantes azuis caíram em
gargalhadas. Agora sua arma mutante tinha virado uma espada enorme e ele
balançava os braços e me afastei para não ser morto. Ele colocou a mão na boca
e tentou falar algo, mas outra crise de riso aconteceu. Ele parecia um
adolescente rindo.
– O elo... – e voltava a rir.
– Chloe! – resmunguei – Do que eles estão rindo?
Ela deu de ombros. Nem ela e nem Austin faziam
ideia do que estava ocorrendo. Os seres azulados estavam batendo com a palma na
mão no chão gelado imitando muito bem o que nós, humanos, fazemos quando
estamos tendo uma crise de riso muito forte depois de rir uma piada muito
engraçada ou ver uma situação muito cômica.
– Parem – ordenei – Do que vocês estão rindo?
O homem parou de rir gradativamente e voltou a
ter sua expressão séria em seu rosto. Ele ajeitou o colarinho e voltou a dizer:
– Caro descendente, creio que você veio ao local
errado – disse Plutão – Ainda não há elo aqui.
– Ainda não! – falei.
– E não vai ter por muito tempo, nossas
tecnologias são falhas. Estamos tentando fazer o melhor para todos.
– Melhor
para todos? A Terra está congelada! – exclamou Chloe – Você está congelando os
planetas telúricos e deixando seus problemas pessoais com o Sol interferir em
quem não tem nada haver com isso.
Plutão semicerrou os olhos. Ele parecia confuso.
– Se a Terra está congelada, o problema é dela!
– ele disse.
Tive vontade de dar um soco em Plutão, porém 1)
Ele era o Rei de um planeta, e eu somente um humano, 2) Seres do Universo são
violentos demais, vide Ison.
– Como ousa falar de minha mãe e de sua irmã
assim? – falou Chloe, tensa e nervosa.
Plutão riu.
– Quem é você mesmo? – perguntou.
– Chloe Selene, desbravadora da Lua – respondeu
Chloe com convicção do que estava dizendo, como se aquilo fosse um lema de toda
uma vida.
– Pode repetir?
– Chloe Selene – bufou ela.
– Ah, ainda não sei quem você é... – ele colocou
a mão no queixo pensativo – Só conheço quem governa o lado claro da Lua, é
claro, o mais importante.
Chloe bufou mais alto e a vi fechando sua mão.
– Calma Chloe – murmurou Austin.
– Desculpe, minha amiga desbravadora – disse
Plutão – Não sabia que essa história era particular.
O momento que fechei meus olhos para piscar foi
o momento que Chloe partiu para cima de Plutão. Os dois se encontraram e
soltaram uma luz fortíssima. O rosnado de raiva dela era a única coisa que eu
ouvia.
– Você irá pagar pelo o que disse – gritou Chloe
caída no chão e em um segundo fendas se abriram saindo água, ela estava fazendo
o mesmo que fizera na prisão em Mercúrio.
Plutão transformou seu arpão em uma espada de
fogo enorme que era coberta por uma proteção em forma de linha que explodia e
deixava um cheiro muito forte. Reconheci imediatamente. A camada de ozônio.
Plutão encostou o arpão no chão e todo o raio de
cinquenta metros tremeu. Os seres azuis tremeluziram e desapareceram. O chão e
tudo dentro de mim tremeram ao mesmo tempo, já tinha presenciado alguns
terremotos, mas a sensação de um terremoto é a terra tremendo, não todo o seu
corpo internamente. Senti todos meus órgãos remexendo e tentando dançarem sem
música. Cai no chão e Chloe e Austin também.
– Vocês devem respeito em meus domínios – ele
disse calmamente – Agora se levantem, pois nós possuímos assuntos para
resolver.
Quando
cinco habitantes normais, ou seja, sem serem azuis, apareceram para nos
carregar em algemas, me senti mais aliviado. Fomos andando até o portão assim:
Austin e eu escoltados por um, e Chloe por três. Mas a sensação mudou assim que
adentramos dentro da fortaleza de Plutão, tudo me deixou enjoado, com dor de
cabeça e as pálpebras pesadas. A rua era feita de gelo, alguns nativos corriam
patinando no gelo e rodopiando. Há alguns metros um conjunto de algo que deduzi
serem casas se materializava. Casas simples, como um sobrado da Terra. Todos
que estavam andando pelas ruas olhavam para nós, como se fôssemos algum produto
sendo vendido ao ar livre.
Caminhamos até uma praça onde havia uma fonte e
um templo muito parecido com os templos gregos.
– Por que aqui parece tanto a Grécia? – consegui
perguntar depois de sentir minha bile parar de mexer.
– Não parece não – Austin disse e pensei se ele
soubesse o que Grécia significava.
Pisquei e vi outra coisa. A rua havia mudado,
era lamacenta e as casas de madeira possuíam vários habitantes nas janelas
pendurados olhando e assoviando para nós. Balancei a cabeça. Eu estava com sono
ou algo do tipo.
– O que está acontecendo? – gritei.
– Ele está sofrendo, Austin – disse Chloe
andando em minha frente algemada acompanhada de três nativos não azuis.
– Parem – pediu Austin e ninguém nos deu ouvido.
Cai no chão fechando os olhos. Eles estavam
pesados demais para ficarem abertos e minha cabeça doía muito. Abri os olhos no
momento e pensei em ter visto Washington. O monumento, o sol, as árvores.
– Por favor, vocês não estão entendendo não? –
pedia Austin com preocupação em sua voz.
Eu não conseguia abrir os olhos, mas conseguia
ouvir tudo. Alguém falando em um ponto muito distante de onde eu estava. Um
barulho parecido com o de um martelo trabalhando há alguns metros e as
explosões naturais do Sol.
Um dos nativos respondeu algo que não compreendi.
– Ele não é de Netuno! Não o compare! – disse
Chloe irritada.
Forcei a mim mesmo a abrir o olho e em uma
fração de segundo com ele aberto me vi em um local muito bonito, verde e claro
e uma grande construção parecendo um estádio mau acabado em minha frente: O
coliseu.
– Eu estou louco? O que está acontecendo? –
berrei.
– Calma, Peter, calma! – gritou Austin e ouvi
uma explosão. Austin se transmutando em estrela. Alguns dos nativos deram um
grito de espanto e saíram correndo, deduzi ao ouvir passos apressados.
– Peter – disse Chloe próxima a mim encostando
sua mão gelada em meu rosto – É o campo magnético, é fatal para você. Todo o
seu conhecimento está indo embora. Você precisa nos tirar daqui!
Apertei os olhos.
Como Chloe esperava que eu os tirasse dali. Eu
estava com o rosto grudado ao chão de gelo, tentando mover meu corpo, mas não
conseguindo e morrendo por dentro. Eu teria de fazer algo? Eu?
– É você que precisa nos ajudar – eu disse.
– Você é o dono desta jornada! Eu o trouxe ao
destino que precisava trazer, fomos guiados por mim e por Sky até aqui, agora,
só você pode nos salvar – ela disse e senti a sinceridade em sua voz.
– Como assim?
– Eu te levei a Mercúrio porque havia um ônibus
guia, uma banheira que levava para a Terra, um cometa que nos levava para o
Universo e uma ideia que você utilizou e pensou – explicou.
– Eu sabia que existia que o código existia!
Você estava mentindo!
– Sim, eu estava – respondeu – Porque eu já
sabia que você já estava tomando conta da jornada sozinho, como deveria ser.
Gelei.
O que Chloe tinha me dito me soou como uma coisa
ruim. Jornada sozinho, como deveria ser
ecoou dez vezes em minha mente em menos de um segundo.
– O castelo é imune ao campo! – gritou Austin se
aproximando de nós.
Chloe me levantou e apoiou no ombro de Austin e
fomos nos arrastando pelas ruas que nunca terminavam. A sensação de não poder
abrir os olhos e pensar direito era péssima, porém a pior coisa era a dor
física. O sol não queria que eu estivesse por perto, não mesmo.
– Vamos! – encorajou Chloe – Estamos quase lá.
Nunca havia passado mal de ir ao hospital as
pressas enquanto estava na Terra. As febres, dores de cabeça, gripe, resfriado
eram resolvidas com remédios conhecidos ou simples chás e se algum dia alguém
resolver passar mal, não faça isso no Universo.
– Por favor, é urgente! – implorou Chloe e ouvi
um portão rangendo abrindo. A sensação foi aliviante. Austin me colocou no chão
e fiquei ali parado por alguns minutos sentindo as dores diminuírem.
– Acharam o caminho fácil – a voz de Plutão
eclodiu no local onde eu estava.
– Sim, foi muito gentil de sua parte retirar a
proteção natural do Planeta sabendo que estávamos com um habitante terrestre,
muito gentil – rebateu Chloe com ironia e percebi que ela não havia gostado de
Plutão.
– Eu poderia mata-los sem retirar nada – ele
disse fortemente e tremi porque era verdade. Eu nunca havia conhecido um
Planeta em sua forma natural, somente Sky e Chloe, Lua, e alguns cometas. Mas
certamente, um Planeta é muito mais forte.
– Olha, viemos aqui porque recebendo um alerta
que vocês, habitantes de Plutão, estariam fazendo um Elo com o Sol, para levar
ele para outro local da Galáxia e formar um novo sistema... – disse Austin,
porém Plutão o interrompeu.
– Formar um novo sistema? – e riu.
– Sim! – afirmou Chloe.
– Vocês acham que mudamos nossa localização para
roubar o Sol para nós? Logo o Sol que me expulsou da família? Vocês são tolos
demais, acreditam em qualquer mentira que é espalhada por qualquer Estrela ou
Luazinha.
– Então por que vocês estão aqui?
– Você já percebeu que somos extremamente frios?
Passamos milênios esperando uma simples luz solar chegar para nós e não chegava
nada. Desenvolvemo-nos em meio ao frio e gelo, e agora está suficiente, tem
gelo para fazer mil meteoros gelados e vender! Estamos aqui para nos
descongelar, pois sabemos que nosso Planeta é tão bonito quanto Mercúrio,
Vênus, Terra e Marte, os telúricos.
– Telúricos? – perguntei.
– Sim, planetas com densidade – respondeu Austin
ao meu lado.
– Mas e as colônias que vocês estão fazendo em
outros planetas? – indaguei me entrosando na conversa – Vocês estão errados! O
certo é cada um cuidar de seu planeta e não invadir o do irmão!
– Tecnicamente, estas colônias são nossas, porém
vendidas para o Imperador fazer o que desejar com elas, não possuímos
responsabilidade pelo o que estão fazendo – respondeu uma voz conhecida. Forcei
meus olhos a abrirem e vi: um menino alto, loiro e com feições parecidas com as
de Plutão. Ele parecia muito com um Terrestre, provavelmente seria o mais
popular jogador de basquete da escola, se estivesse vestido corretamente. Ele
usava uma túnica azul que prendia no pescoço e uma roupa branca por baixo,
cheia de enfeites como desenhos de peixes, pássaros, leões. Um zoológico todo
em sua roupa.
Ele não parecia nada contente, seu jeito de
andar era como se estivesse cansado arrastando suas pernas descendo a escada
transparente de gelo. Percebi onde eu estava: um grande salão com paredes azuis
no estilo medieval. Nas paredes dependuravam tochas que quase entravam em contato
direto com o gelo. Nativos azuis vestiam armadura completa e permaneciam nos
cantos do local vigiando cada movimento nosso.
– Brandon – sussurrei e lembrei-me de quando
estávamos em Mercúrio, presos na Base e o Dr. Reynolds realizou uma ligação
para ele, e após morrer, eu troquei poucas palavras com a Alteza.
– Descendente – ele disse de volta.
Chloe, Austin e Plutão olharam para a cena
assustados, levantei-me do chão e me pus em pé com ajuda de Austin.
– Você deveria ter escutado meu conselho – o
príncipe voltou a dizer e a voz dele passou pela minha cabeça novamente “Não venha a Plutão agora!”.
– De onde vocês se conhecem? – murmurou Austin
me cutucando.
– Depois eu conto – respondi.
Encarei o príncipe que já estava sentado em seu
trono.
– Você é no mínimo cara de pau por ter coragem
de dizer para eu me afastar daqui! – falei – Vocês estão com meu pai! E vão afastar o Sol de
nós!
– Duas afirmações falsas – ele respondeu na
maior calma.
– FALSAS? VOCÊ ESTÁ LOUCO! – berrei.
– Sim!
– Você que está louco! Não viajamos a toa! –
disse.
– Vocês vieram atrás do Imperador, Plutão, para cortar o elo e voltar para casa, porém como
vocês já notaram não há nenhum elo aqui e mesmo que tivesse, seria só para
descongelar a superfície e nos adaptar novamente – o príncipe explicou.
– Eu disse – Plutão se gabou.
– Mas vocês mandaram Caronte para nos atacar! –
julgou Chloe.
– Atacar uma certa pessoa, e não a base inteira.
Não somos vingativos desse jeito.
– Vocês estão atrás de quem? – perguntei.
– Digamos que estamos atrás de quem possui
dividas conosco ainda, após usufruir de todos nossos benefícios e nossa
hospitalidade – respondeu Plutão.
– Não pode ser – disse Chloe, decepcionada e
caiu de joelhos no chão.
Austin foi andando até ela para ver o que tinha
acontecido, e eu fiquei parado, não tinha muitas forças para andar tanto.
– Precisamos voltar! – gritou ela.
– Por quê? – perguntei.
– Isso foi uma armadilha, Peter! Não há elo
maligno, não há Plutão ameaçador. Só há uma coisa: alguém que deveu tanto que
teve que trair alguém e se refugiar em outro local que o escondesse.
Um
flashback surgiu em minha mente. Logo ao chegar à Lua, fui recebido por Deimos e ele disse que era chamado de
traidor.
Tudo fez sentido.
Deimos era o traidor.
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