10 ✧ A ÚLTIMA VEZ
– Eu não sou o imperador, nem traidor, só fui
tratar dos meus assuntos e infelizmente invadiu o espaço de vocês – explicou
Plutão.
Chloe continuava caída no chão agora com a testa
encostando-se ao gelo tentando pensar em algo. Ela se auto xingava e passava a
mão em seus cabelos prata descontroladamente.
– Precisamos ir embora! – disse ela levantando
seu rosto. Ela parecia desapontada consigo mesma.
– Eu não iria – avisou Brandon, o príncipe –
Você sabe o que vai acontecer já.
Chloe relutou e deu um soco no chão.
– Merda!
– O que está acontecendo? – perguntei.
O príncipe franziu o cenho e olhou para Chloe,
que assentiu.
– Tem muita coisa sobre o Universo que você não
sabe, jovem descendente.
Ele virou para trás e voltou a subir as escadas.
Olhei para o salão e não vi mais Plutão por ali.
– Me sigam – disse ele.
Apoiei-me em Austin e Chloe saiu do chão e
subimos as escadas. Os degraus feitos de gelo eram escorregadios e nós três
quase caímos muitas vezes, ao passo que Brandon subia como se fosse feito de
material antiderrapante.
Subimos e demos de cara com um corredor enorme,
cheio de portas que davam para vários cômodos – o que me lembrou um pouco a
Base Lunar -, eu percebi que Austin estava agoniado já de ter que me levar,
então tentei andar por mim mesmo. Dei dois passos e quase caí, ele me segurou e
dei um sorriso retorcido meio que “Odeio precisar de ajuda”.
– Precisamos ir para uma sala vazia – disse
Brandon.
Ele abriu uma porta de metal cinza e entramos em
um cômodo não tão grande, mas sem nada. Nenhum móvel, nenhuma cadeira, nenhuma
tecnologia, somente o chão e as paredes. Austin me pôs no chão encostado na
parede e assim nos sentamos: nós três de frente a Brandon.
– Bom, peço perdão pela minha atuação lá em
baixo – começou ele gesticulando.
– Ahn? – indaguei.
– Sim, atuação! Aprendi essa palavra com vocês
terrestres. Não é assim que se diz? Como é? – ele fez uma cara de preocupado,
mas curioso para saber a resposta.
– É atuação mesmo – respondi.
Ele suspirou em alivio.
– Bom, estou aqui para ajuda-los, contanto que
vocês me ajudem.
– O que você quer? – falou Chloe grossamente.
– Eu estou cansado daqui, quero fugir, quero
viver, quero parar de depender de meu pai. Odeio ficar em reunião, odeio ser de
um Planeta que tenta todos os dias alcançar algo positivo, mas nunca consegue.
Há anos que estamos tentando congelar o gelo daqui, mas nunca conseguimos.
– Ah, pelos anéis de Saturno! – disse Chloe e
Brandon estremeceu – Vamos ir embora, não aguento mais essa baboseira.
E levantou.
– Você tem certeza que vai conseguir chegar à
Lua a tempo? – disse ele com os olhos fixos no chão e Chloe parou de
andar.
Ele estava certo. Precisávamos de algo que nos
levasse à Lua o mais rápido possível, agora que sabíamos que o inimigo era
Deimos.
– Se você for com calma, podemos salvar mais que
uma pessoa, você sabe muito bem – ele falou.
– Do que vocês estão falando? – indaguei.
– Não sei se você vai acreditar, Peter, mas tudo
o que está acontecendo já estava predestinado a acontecer, tudo isso sabe?
– Isso é mentira! – replicou Chloe e se sentou.
– James, o descendente de Júpiter, procurou por
toda a galáxia uma estrela especial, uma que sabia o futuro, e ao achar, sugou
todo o conhecimento que possuía e escreveu tudo em diários, cadernos, papéis.
Dizem que citava um novo descendente que viria de um Planeta muito desenvolvido
e que ele iria varrer o Universo com suas próprias escolhas.
– Varrer... – refletiu Austin.
Senti um arrepio na espinha.
– E no caso, sou eu? – perguntei.
– Eu não sei – respondeu Brandon mordendo o
canto do dedo – Eu acredito que sim, porém há muitos descendentes que ainda não
foram descobertos, só estão esperando o momento certo.
– E o que significa varrer?
– Eu preciso dizer? – disse ele.
Fiquei paralisado. Entendi muito bem o que ele
tinha dito. Significava mortes, e seriam minhas escolhas que decidiriam cada
vida que seria poupada ou ceifada.
– Como eu disse, precisamos voltar! – insistiu
Chloe novamente.
– Somente se vocês me ajudarem – voltou a dizer
Brandon.
Chloe olhou para Austin e os dois assentiram com
a cabeça, como se tivessem chegado a um consenso, porém sem dizer uma só
palavra.
– Levamos você junto conosco para a Lua, e de lá
você decide o que você vai fazer da vida, tudo bem? – propôs Chloe.
O príncipe estudou a oferta.
– Eu quero fazer a diferença sabe? Só quero ser
salvo agora, quero acreditar que o futuro sou eu que faço e não algo escrito
sobre mim.
– E eu não quero saber disso – cantarolou Chloe.
– Ah, me deixa pensar um minuto – pediu o
príncipe.
– Eu disse que era verdade, Peter, os arquivos
existem sim! – disse Austin rindo como se tivesse descobrindo algo muito legal.
– Existem nada, eu não acredito nisso mesmo! –
falou Chloe.
– Mas você nem leu – rebateu Austin.
– Quem disse que não? – retorquiu ela.
Os dois se encararam por um momento, senti a
tensão no ar. Chloe de um lado com seu rosto firme e Austin com seu olhar de
desaprovação.
– Eu vou! – exclamou Brandon.
– Você é filho de Plutão, certo? – perguntei
para quebrar o gelo – Você não acha que ele irá atrás de você?
Brandon olhou para o chão por alguns segundos,
provavelmente deveria estar pensando no quanto Plutão ficaria furioso se seu
herdeiro fugisse. Olhei para Chloe e agora ela também estava pensativa. Este
era um ponto fraco nosso, tínhamos de ir embora, mas não podíamos ir com outro
fugitivo, já tínhamos Austin.
Um pensamento surgiu em minha mente, dando-me
esperança. Era isso!
– Brandon, você irá nos levar para outra casa.
Somente isso – disse.
– Como?
– Você vai informar para seu pai que irá nos
levar para outro planeta para habitarmos.
– Do que você está falando? – perguntou Austin.
– De Ceres – falou Brandon com um brilho em seus
olhos – Meu pai vai gostar muito da ideia de novas pessoas em Ceres, tudo lá
está muito calmo para estar dando certo. Vamos!
Consegui levantar sozinho e dar alguns passos.
Minha cabeça ainda doía, porém somente uma dor no fundo mesmo da mente, os
efeitos da interferência solar em meu corpo tinham cessado. Toquei na pulseira
e pedi uma proteção extra, algo que me ajudasse a não sofrer com isso
novamente. Descemos as escadas de gelo e encontramos o local cheio de guardas
azuis correndo para lá e para cá, preocupadíssimos e falando em uma língua
muito estranha, inaudível e incompreensível.
– O que aconteceu? – perguntei a Chloe e Austin.
Os dois não souberam responder e vi a porta
principal abrindo fortemente. Três habitantes azuis com conchas em suas mãos
estavam parados ali, um levou a concha na boca e disse:
– Iremos ser atacados! Eles sabem que eles estão
aqui! – e apontou para nós.
O som dos guardas azuis falando cessou no
momento, todos olharam para os habitantes com as conchas e arregalamos os
olhos. O caos tomou conta do salão, os azuis saíram correndo para fora e
Brandon desceu as escadas desesperado.
– Venham! – gritou ele.
Descemos as escadas de gelo torcendo para não
escorregar. Eu conseguia ouvir gritos em outros locais, súplicas e berros de
agonia.
– BRANDON! – a voz grave de Plutão ecoou atrás
de nós, virei-me e o vi parado no segundo andar – ATIVE TODA A PROTEÇÃO.
– Ok pai! – gritou ele de volta.
Saímos do salão e vi como realmente Plutão era,
já que estava com os olhos fechados. Havia um jardim muito sombrio, as flores
congeladas e os projetos de árvores eram secos demais. Tudo parecia morto e
triste. Austin me agarrou pelo braço e passamos o jardim e abrimos os portões
de gelo. As ruas seriam bonitas, organizadas, o chão seria feito cuidadosamente
com gelo em forma de paralelepípedos, se nada daquilo estivesse acontecendo.
Atrás de nós, havia o Sol, e graças às estrelas,
não sofri novamente com nada, e na nossa frente um ponto enorme estava vindo,
um ponto vermelho e brilhante. Brandon começou a correr para fora da fortaleza
e o seguimos.
Na saída da fortaleza uma multidão de
habitantes, tanto azuis tanto os normais, impediam a nossa passagem. Brandon,
mesmo sendo o príncipe herdeiro de todo aquele Planeta e aquele povo teve de se
espremer e pedir licença para conseguir sair. Chloe gritou: “Vou matar todos que estiverem em minha
frente” e alguns saíram desesperadamente levando a mão na boca assustados.
Aproveitei e segui Chloe e conseguimos sair, somente Austin que ficou preso na
multidão, mas saiu em alguns segundos arfando.
– O que é isso? – dizia os Plutônicos.
Olhei para o céu e consegui ver o que eles
estavam temendo tanto. O ponto vermelho era Caronte, o satélite de Plutão,
seguido de um meteoro diferente. Ele era enorme, do tamanho de uma escola de
ensino médio no mínimo e era rodeado por um anel, como os anéis de Saturno.
– Só tem uma pessoa que consegue realizar auras
desse jeito – murmurou Chloe perplexa.
– Deimos – completou Brandon.
O chão tremeu e vimos que pelos lados do
Planeta, meteoros menores também com anéis estavam chegando. Estavam atacando
Plutão de todos os lados.
– Peter, você tem que voltar para o castelo! São
anéis magnéticos, vão quebrar a proteção de Plutão – falou Chloe, preocupada.
A descarga de desespero desceu pelo meu corpo
novamente. Eu teria que voltar sozinho para o Castelo para me salvar e deixar
meus amigos ali?
– Vamos todos juntos! – disse – Brandon,
precisamos ir embora daqui!
O chão tremeu e nós quatro caímos e sofremos com
outro tremor. Algo explodiu atrás de nós, virei o rosto e vi meteoros menores
caindo em construções dentro da fortaleza. O fogo subiu em lareiras e os gritos
voltaram. Deimos estava se vingando.
Levantei em meio ao tremor e voltei correndo
para a fortaleza. O portão estava fechado.
– ABRAM PARA MIM! – gritei balançando o ferro
gelado.
Os habitantes azuis olhavam para mim com ódio,
deveriam saber que eu era da Terra e não queriam confiar em mim.
– ABRAM! NÃO ESTOU AQUI PARA ATACAR NINGUÉM –
berrei.
Algo se chocou no muro da fortaleza explodindo o
gelo. Todos nós fomos jogados deslizando pelo chão gelado pela força da
explosão. Fechei os olhos e senti meu corpo mole. Estava começando novamente.
Caído nos
destroços do muro havia uma mulher. Ela tinha as mesmas feições de Brandon e
Plutão. Loira, cabelos caindo nas costas, olhos azuis e um lindo vestido
vermelho. Reconheci pelo brilho que ela estava provocando no céu, Caronte.
– Caronte! – chamei tirando ela do chão.
– Quem és tu? – a voz dela era uma mistura de
melancolia e depressão.
– Peter Allister, descendente da Terra – falei.
– Ah, foste tu que estavas na Lua durante nosso
ataque a Deimos? – ela perguntou.
– Como você sabe disso? – ela estava olhando para
o céu com um olhar desesperador.
– As estrelas falam meu jovem – respondeu.
Outro tremor.
– Preciso voltar para o castelo – eu disse.
– Vos precisa voltar para Lua, urgente – ela
disse, preocupada – Sky.
Somente o nome de Sky me deu a clareza de tudo que
estava ocorrendo. Sky estava em perigo. Deimos era o braço direito da Base
Lunar, e nosso inimigo no momento.
– Brandon irá guia-los, volte para o Castelo e
procure a sala dos espelhos!
Pulei por cima dos destroços do muro e comecei a
correr pelas ruas de Plutão tentando chegar ao castelo o mais rápido possível. Cada
explosão em algum local eu tremia de medo e desesperado. Eu não ouvia minha
respiração. Corria somente entre os destroços de várias casas sendo explodidas
por meteoros e soltando fogo para o alto. Alguns habitantes azuis estavam
caídos no chão, alguns mortos ou simplesmente com feridas enormes e
queimaduras. Era uma cena triste.
Uma fagulha de fogo caiu em meu cabelo e uma
explosão ocorreu do meu lado. Voei para o alto, meu corpo todo queimando e cai
na água. O chão havia explodido e embaixo do gelo, havia água gelada. Meu corpo
foi de calor infernal para gelo glacial. Meu olho ardeu ao entrar em contato
com o líquido gelado. Mergulhei e senti todo meu corpo queimando de frio.
Uma mão me pegou e me puxou para cima.
Deitei no gelo escorrendo água e abri os olhos,
era Austin, ele estava totalmente fora de si. Seus olhos estavam arregalados e
sua roupa totalmente queimada, ele parecia ter lutado em uma guerra que no
mínimo durou uns vinte anos. Ele caiu no chão do meu lado e ouvi sua respiração
forte, ele estava respirando! Pesadamente, mas estava.
Dei um tapa em seu rosto e ele piscou algumas
vezes e caiu na real. Ele estava começando a criar sentimentos e sensações
humanas, como medo e desespero, as quais nenhuma estrela possui.
– Austin! – chamei, mas ele ainda estava longe.
Ele olhava para trás toda hora, levantei e me
sentei no gelo para ver também. Caronte estava em sua forma natural de
satélite. Ela era enorme e estava na frente da Fortaleza Plutônica, protegendo
sua casa. Vindo correndo pelo universo, o grande meteoro com anéis mostrava seu
poder.
Alguns habitantes plutônicos azuis estavam
subindo em cima de Caronte e levando consigo armas cinza, parecendo bazucas.
Enquanto isso, ao nosso lado, meteoros pequenos continuavam destruindo a cidade
por dentro e o grande xeque-mate viria com o ser enorme.
– Cadê Chloe e Brandon? – perguntei.
Austin não respondeu. Ele ainda respirava
pesadamente, tossindo às vezes como se tivesse bebendo água e se sufocando com
a mesma. Ele devia ter visto algo muito ruim para se desabilitar assim.
Abracei-o e ele chorou.
– O que aconteceu? Austin?
Suas lágrimas desciam pelo meu ombro, fiquei em
silêncio. E vi.
Brilhava como holofotes de shows, vários pontos
grandes flutuavam pelo ar, diminuindo e aumentando a iluminação de propósito.
Reconheci pelo alinhamento de três. As três Marias.
No meio, havia uma estrela enorme, o triplo das
outras que brilhava espetacularmente. Órion.
O pai de Austin.
– Vem comigo – disse puxando ele pelo braço.
– Não posso – ele disse baixo e distante, mas
mesmo assim consegui senti toda a dor que a voz dele proporcionava: medo,
desespero, angústia, agonia, tudo junto em só um tom – Ele veio me buscar.
– Você não precisa ir agora, Austin, vamos, irei
te salvar! – falei com pouca certeza, realmente eu não estava conseguindo lidar
com ter que guiar uma jornada, quanto mais resolver problemas familiares.
– Eu prefiro morrer a me entregar – disse ele se
levantando e pondo sua cabeça em pé.
E saiu correndo.
– AUSTIN! – gritei até o ar se expelir todo de
meus pulmões.
Austin
sumiu ao virar a esquina e não o segui, talvez ele fosse procurar Brandon e
Chloe, que eu não fazia nenhuma noção de onde estariam no momento. Eu precisava
ir ao Castelo visitar a sala dos espelhos antes de ir, como Caronte indicou.
Levantei do chão gelado e fui correndo para o
Castelo, vi mais destruição e desespero. Ruas estavam interditadas com
destroços de casas, prédios caindo, árvores secas impedindo a passagem e
diversos corpos flutuando em águas geladas nos buracos abertos.
Atrás de mim, Caronte estava protegendo ainda a
fortaleza, esperando o meteoro com anéis chegar, e vi Austin subindo nela, como
os outros habitantes de Plutão. Ele parecia determinado, subia e encaixava uma
espécie de faca na superfície rochosa do satélite para escalar. Pensei em
gritar, mas eu não tinha mais tempo. Precisava entrar para ver o porquê de
Caronte pedir para eu ir a esta sala e voltar e salvar Chloe, Brandon e Austin.
Esta jornada era minha e cada falha seria por minha culpa.
Entrei novamente no castelo passando pelo jardim
gelado e cinza, mas não olhei muito, segui reto para a porta. Abri e o silêncio
pairava pelo ar. Se eu não tivesse vindo aqui antes, acharia que nunca foi
habitado. Uma explosão e um tremor mais forte. Caí de joelhos no chão. Levantei
e outro abalo. Estava ficando mais constante agora.
A escada estava rachada no meio de tanta
vibração que recebeu, subi pulando como se estivesse jogando amarelinha para
não pisar em algum local ruim e ela rachar por completo. Cheguei ao corredor e
fui abrindo as portas. Salas vazias.
– Merda, Caronte – praguejei depois de abrir
mais de vinte portas.
As luzes do corredor falhavam, parecendo uma
festa, mas uma festa onde ninguém se divertiria. Continuei andando e achei a
mesma porta que nós quatro entramos quando Brandon nos trouxe aqui. Abri.
A sensação foi estranha. Eu já tinha estado
naquela sala, e não tinha nada. Agora estava repleta de espelhos nas paredes,
no chão e no teto. Eu me via em todos os ângulos possíveis e via várias vezes
eu mesmo. Minhas roupas estavam destruídas, meu casaco estava péssimo, queimado
e rasgado em algumas partes. Meu cabelo chamuscado e havia um hematoma em meu
rosto que estava ficando roxo. Sentei no chão espelhado e senti algo diferente.
No meu lado direito, eu via a Terra no espelho e
no esquerdo a Lua. A Lua se remexia como se estivesse sendo sufocada e a Terra
rodopiava mais rápido possível, agonizada também. Na parede da minha frente, vi
um planeta vermelho marrom, Marte. Havia um ponto cinza rodopiando o planeta e
tremendo também. Outro ponto apareceu em marte, mais escuro agora. O cinza e o
escuro se tocaram várias vezes, até que o escuro bateu tão forte no cinza que
ele voou fora de órbita.
O ponto escuro flutuou saindo de perto de Marte
e rodopiando encontrou a Lua. Caiu na superfície e sumiu. A Lua deu uma
tremida, sabendo que algo tinha acontecido e todos os planetas se apagaram,
deixando a sala em total escuridão.
A sala iluminou-se novamente quando o teto
mostrou a Lua. Branca, plena e linda, era realmente um astro de beleza. Ela
parecia tensa como se estivesse segurando a respiração. Algumas horas uma ponta
escura aparecia do outro lado, mas a parte clara tremia a beleza clara voltava.
O lado escuro da Lua.
As coisas estavam começando a fazer sentido. O
espelho da minha frente me mostrou a Base Lunar, uma adolescente e uma menina.
Sky e Chloe, presumi na hora. Um homem de cabelos escuros e olhos
excepcionalmente cinzas.
Havia em cima de uma mesa de metal uma mistura
que logo reconheci como tinta para cabelo.
– Vou pintar seu cabelo, para eles não te
reconhecerem – disse Sky.
– Tudo bem! – falou o homem.
– Tio Deimos, vamos explorar o meu lado depois?
– disse a menina com animação.
– Ok! Precisamos descobrir mais coisas – e
bagunçou o cabelo de Chloe.
E Sky começou a pintar o cabelo de Deimos.
O espelho escureceu e o do lado direito mostrou
a Base atualmente. Reconheci a sala principal com a maquete com os planetas, a
mesa no meio, os computadores e Herbig e Haro correndo um atrás do outro.
– É, ele não sobreviveu – disse Deimos, agora na
mesma feição de quando o vi pela primeira vez.
Sky apareceu com toda sua graça na sala.
– Mande o próximo, então.
Austin apareceu no espelho mexendo nos
computadores. Ele parecia alegre demais, era tão diferente o ver assim depois
de o ver chorando.
– É o filho dele – falou.
– Mande primeiro os dois alertas – Sky sugeriu.
– Deimos – ponderou Chloe na mesa.
– Eu? Não faço mais isso! Lucy, por favor, nos
dê a honra – ele respondeu.
Lucy, a estranha que vi na Base, estava deitada
com a cabeça para baixo no puff prateado que sentei. Ela fechou os olhos e
brilhou, brilhou tão forte que a sala iluminou por completo.
– UHUL! – gritou Chloe – Arrasou garota!
A sala se apagou novamente.
Eu tinha acabado de ver como Deimos havia
chegado à Lua e como eles tinham reagido com isso. Quem era Sky e Chloe, e como
eles me chamaram: “Ele não sobreviveu”
ecoava em minha cabeça.
Meu pai não podia estar morto.
Ele me ligou.
O teto se iluminou novamente e agora Sky estava
conversando com Austin. Eles pareciam estar em algum corredor. Sky checava com
os olhos de dois em dois segundos para ver se não havia ninguém os vendo.
– Austin, você vai nessa jornada, entre no
ônibus e dê impulso para eles saírem da órbita, será difícil, mas conto com
você – disse sussurrando.
– Eu não posso sair, você sabe – ele respondeu.
– Shhhhhhhhhh! Ninguém vai saber.
Austin pareceu confuso.
– Eles vão vir buscar Deimos à força, precisamos
tirar o descendente daqui urgentemente, ou senão ele vai atrás dele.
– E como eu vou saber quando devo ir me esconder
no ônibus? – perguntou ele.
– Eu vou misturar as coisas por aqui,
provavelmente acordaremos com um alarme e gravidade.
– Tudo bem, mas você só irá entregar Deimos né?
Ouvi coisas ruins sobre suas ideias...
– Não se preocupe – disse Sky pondo a mão no
ombro de Austin – Tudo vai dar certo, está escrito!
E apagou.
Tudo estava se misturando em minha mente como
matéria escolar, tudo sendo jogado ao mesmo tempo. Muita informação para pouco
tempo para digerir.
Levantei e os espelhos voltaram a mostrar eu
mesmo. Minha expressão fundia-se entre surpresa, decepção, confusão e espanto.
Mas era determinada. Eu estava determinado e no fundo do meu conhecimento, eu
sabia o que, como, e porque fazer.
Eu tinha que ir atrás de Deimos e salvar Sky.
O espelho brilhou novamente.
Era meu quarto no Brasil. Minha mãe jovem
chorava do lado do meu berço branco. As paredes estavam enfeitadas com
elefantes, cavalos e cachorros correndo. Carrinhos, bonequinhos, ursinhos e
roupinhas estavam jogados em um canto, havia uma réplica pequena da Terra
pendurada junto com a lâmpada e na cômoda, um sistema solar de brinquedo.
– Você precisa ser o que o amanhã precisa, Peter
– ela batia a cabeça na madeira no berço, chorando e soluçando.
E apagou novamente. Meu coração apertou. Eu precisava
sair dali. Abri a porta e cai no corredor com outro tremor.
Eu me sentia completo agora. Eu odiava depender
de Chloe, de Austin, de Haro para ter informações a cerca do que eu estava
fazendo ali, qual era a minha conexão com aquilo tudo, e por que era eu. Eu
sabia tudo.
Corri pelo corredor e cheguei à escada que
estava rachada e derretida. Pulei e cai em cima do gelo. Mais um tremor, agora
eles estavam mais constantes e mais fortes.
Uma explosão forte invadiu meu ouvido, o meteoro
bateu na lateral do castelo, explodindo tudo. Joguei-me no chão, enquanto tudo
se transformava em pó. Cobri minha cabeça para não ser acertado por nada.
Saí me arrastando e engatinhando até a porta.
Não lembrava que demorava tanto para sair do castelo, talvez a situação estivesse
ajudando a ficar mais lento o tempo, já que não tínhamos um controle de
tempo/espaço no Universo.
Plutão estava em ruínas, não havia quase nenhuma
casa em pé, tudo estava destruído, fumaça subia ao ar e se encontrava na
atmosfera formando uma grande massa escura que impedia do Sol iluminar tudo.
Parecia um grande dia nublado, triste e chuvoso, mas não era, era só triste.
Os corpos haviam se triplicado. Armas, arpões, e
armaduras estavam partidas e espatifadas pelo chão que estava rachado e destruído.
As ruas haviam se transformado em grande lagos com vários buracos no gelo.
Caronte estava lá na frente ainda, com vários
habitantes ainda atirando e jogando seus arpões tentando destruir os meteoros
menores, o maior, estava muito mais próximo. Calculei alguns minutos para a
colisão.
Subitamente os muros da Fortaleza explodiram jogando
gelo para todo o lado, Três meteoros explodiram no chão e a multidão que
aguardava no portão desceu água abaixo.
Sai pelo jardim que estava em chamas, as flores
gélidas tinham sido queimadas e as árvores secas nem ali estava mais.
Ouvi gritos de desespero vindo de cima de
Caronte. Os guardas azuis estavam se comunicando. Avistei Austin. Eu precisava
salvá-lo.
O anel do meteoro tocou Plutão, o abalo foi tão
forte que fui jogado para cima como se estivesse agarrado em um elástico
gigante. Meu corpo flutuou no ar por meio segundo e fui arremessado para o chão
com brutalidade. Os restos dos prédios e casas destruídas tremeram com o
terremoto e se reduziram a pó, cobrindo toda a visibilidade a um palmo de mim.
Segurei minha própria mão e avancei na escuridão
proporcionada pelo pó negro. Sentia-me mais seguro me auto segurando, estava em
meu pior pesadelo: não ter ninguém e nada para me ajudar. Imaginei Plutão como
um grande quarto onde não há luz e mesmo que se tivesse, ela não iria me
encontrar e muito menos me ajudar, as paredes, mesmo se eu encostasse nelas
para tentar pedir ajuda, não iriam me ajudar, recusando qualquer envolvimento
com o que acontece.
Tossi várias vezes até senti outra explosão
seguido de um vento arrebatador, semicerrei meus olhos para tentar ver algo,
mas o vento não me deixava ver nada. Caronte iluminou-se e consegui ver com um
pouco de clareza o que esta acontecendo: O meteoro enorme tinha colidido com
Caronte.
A explosão iluminou Plutão totalmente. Todos os
habitantes azuis, os normais, e inclusive Austin que estava em cima do satélite
foram jogados para o ar. O terremoto e o abalo racharam o chão imediatamente,
destruindo todo o gelo. Ouvi a atmosfera rachando e os raios magnéticos do sol
penetrando no solo. Dei um grito de agonia. Tudo estava sendo destruído.
Corri na direção do castelo enquanto Plutão era
dizimado, não tinha volta, tínhamos arruinado um planeta todo. Eu deveria ter
ouvido que não devíamos ir para Plutão. Só foi Deimos saber que estávamos aqui
que mandou todos esses meteoros.
Corri pulando em locais onde o gelo parecia
firme, enquanto os outros rachavam próximos a mim revelando a água que eu tinha
caído.
Cheguei no jardim gélido de novo e um meteoro
explodiu no momento na encosta do Castelo explodindo a porta e destroçando a
entrada do castelo em pedras. O vento batia nas minhas costas e olhei para
trás. Plutão agora era um mundo apocalíptico, um deserto aquático, Caronte não
estava mais ali, o meteoro com anéis havia explodido e destruído a cidade toda
e o terremoto estava embaixo de meus pés agora.
O chão rachou no portão do Castelo, alguns
metros de mim. Corri sem ousar olhar para trás até um gazebo que se
materializava no meio do jardim já destruído. Havia uma estátua de Plutão atrás
dele e ela estava rachada ao meio. Subi no gazebo e esperei.
O chão tremia e eu segurava na base da
construção aguardando. Minha visão era de um mundo diferente do que eu tinha
visto: tudo estava em pó, ou em destroços. O gelo derretendo com o sol e
rachando com o meteoro.
O gazebo balançou e se inclinou como um navio.
Tentei ir para o outro lado agarrando ao chão de madeira, cambaleei por um
momento e desisti. Rolei até bater de costas na madeira e esperei o gazebo
inclinar-se por completo. O tremor balançava meu corpo como se estivesse em uma
cadeira de choque.
A madeira
ruiu e a construção virou cento e oito graus e entrei na água gelada fechando
os olhos e o nariz esperando o meu momento final.
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