3 ✧ O QUASE CONTATO
Depois
de ouvir tudo aquilo, o que eu mais desejava naquele exato momento, era que
existisse um psicólogo estelar, ou alguma pessoa que pudesse colocar todos
esses planetas em uma roda de cadeiras e conversar e questionar “Qual é o seu
problema? Diz que vou te ajudar”, para não ter que envolver os pobres humanos –
eu – nesses problemas familiares milenares.
Achei
que a ajuda era referente a meu pai, já que eu jurava que tinha ouvido a voz
dele no telefone e não para ajudar um planeta, ou alguém que domina ele. Meu tio Plutão, ri internamente.
–
Eu acho que eu não entendi – disse e realmente não estava entendendo nada.
Deimos
bufou e se levantou da mesa. Ninguém disse nada. Chloe cutucou Sky e ela deu um
tapinha em seu braço.
– Para que vocês precisam da minha ajuda?
Vocês não podem resolver por vocês mesmos não? – indaguei.
–
Eu, Sky, não posso adentrar em outros territórios sem autorização de um de meus
tios, e do jeito que está agora... Creio que ninguém vai deixar ninguém entrar.
–
Mas se você não pode, por que eu posso? – perguntei batendo a mão na mesa.
Fazia sentido, Sky disse que era filha da Terra e o satélite natural. Se eu sou
descendente da mesma, por que ela não pode, e eu posso?
–
Porque ninguém o conhece até então – explicou Lucy e voltou a ficar calada.
Sky
bateu na mesa com sinal de concordância ao que Lucy disse. Eu realmente estava
ali pensando em meu pai, e Sky disse simplesmente que eles tinham perdido o
contato com ele, como se fosse a coisa mais normal do mundo.
–
Ainda não faz sentido – impliquei esperando mais respostas. – O que realmente
está acontecendo? E meu pai?
–
Seu pai está perdido por aí, enquanto ele não fizer contato... – Chloe estava
dizendo, mas interrompi-a.
–
Ele fez contato comigo! Hoje... Ontem... Sei lá – me toquei que não sabia que
horas, que dia, e como funcionava o tempo no espaço, ia perguntar as horas, mas
achei melhor falar tudo logo – Ele ligou do mesmo jeito que vocês ligaram,
restritamente, aqui no meu celular – tirei-o do bolso e mostrei.
“Ligações atendidas: Numero
Restrito, 0:27, 07:49 am”
Foi
então que eu vi que a bateria do celular não tinha descarregado. Estava 59%
ainda, quando o normal era carregar ele várias vezes no mesmo dia, de
madrugada, ao chegar da escola, e antes de dormir.
–
Austin, vê o número real desta ligação intergalática, por favor? – Sky disse e Austin
pegou meu celular e saiu andando em direção aos computadores – Então, Pedro
Peter...
–
Pedro – corrigi-a.
–
Vou dizer logo que está acontecendo, sabe a história que eu acabei de contar da
minha família? Então, seu tio, meu tio, Plutão, se envolveu há alguns anos em
um problema sério: Estava alimentando a chance de planetas anões se realizarem
uma rebelião contra nós, verdadeiros filhos – ela dizia e me fitava tão
concentrada que parecia que tudo aquilo era verdade – e claro, papai não gostou
nada disso, e bani-o do sistema, alterando sua órbita, mas claro que ele estava
aprontando...
–
Já peguei o número, Senhora – Austin disse e me entregou o celular.
–
Então, Plutão, lançou um elo com ele, Ceres, Haumea, Makemake, e Éris no Sol,
mas para que? Para levar o sol para outro local do sistema solar, inverter os
papéis, alterar a ordem atual.
Os
irmãos Herbig e Haro faziam sinais com as mãos de alteração, mexer, rindo e
brincando entre si.
–
Este elo está se tornando cada vez mais forte, e já está afastando o Sol da sua
posição normal. Eles estão levando para o canto de nosso limite, e planejam
orbitar em volta dele. Caso isso aconteça, nós, verdadeiros filhos, ficaremos
sem luz e morreremos de frio. A mãe, Terra, já está preocupadíssima com o
inverno que está atingindo as regiões polares e as regiões tropicais também, a
região litorânea do Brasil está nevando, Pedro. Você já tinha visto isso?
Balancei
a cabeça negativamente. Não tinha contato com o Brasil fazia tempo, mas
lembrava de quão quente alguns dias podiam ser, mas nunca havia visto notícia
de nevasca lá. Tive o parâmetro com Washington e o pior inverno que estava acontecendo.
–
Se um pai está com problemas com um filho rebelde, por que ele não pode
resolver sozinho? – perguntei e Sky abriu a boca em espanto.
–
Meu avô possui somente quatro bilhões e quinhentos e sessenta e sete mil
milhões de anos, você acha que ele tem idade para isso? – ela retrucou.
–
E por que nenhum dos filhos quer ajudar? – rebati.
–
Você conhece as famílias, meu jovem, Sol criou todos, ajudou a se desenvolverem
e criou atmosferas para cada um, para cada um ter sua própria vida sem
incomodar o vizinho, após isso, todos se sentiram independentes ao ponto de não
precisar mais de nada vindo dele. Os que tinham ainda respeito ao pai
permaneceram perto dele, e os que nem ligavam se afastaram.
–
Então, a Terra é a terceira no quesito consideração a seu pai, mas é a primeira
a querer ajudar? – perguntei.
–
Ao menos estamos ajudando, correto? Entendeu? – ela perguntou, mas pelo tom de
sua voz, saberia que eu não deveria dar nenhuma resposta.
A
mesa voltou a ficar em silêncio.
–
Você vai nos ajudar? – Sky disse.
Pensei
por um momento. Mas eu realmente não saberia o que eu teria que fazer, então
por que daria certeza de algo que não tinha convicção e nem coragem?
–
E o que eu devo fazer?
–
Há um ônibus espacial esperando você e sua tripulação. Chloe será a motorista,
e você pode levar duas pessoas. Vocês vão viajar até Plutão e cortar o Elo,
deixando o Sol livre. Somente isso – respondeu.
–
E quanto a meu pai? – perguntei.
–
Você pode buscá-lo na volta, mas o mais importante, é salvar o Sol e a vida
terrestre.
–
E minha mãe? Ela vai acionar o governo quando perceber que eu sumi – lembrei-me
dela. Havia prometido ir jantar com ela hoje a noite em um restaurante fino,
gostaria de saber quanto tempo se passava aqui na lua, para saber se ela estava
trabalhando, ou em casa me esperando.
–
Monica? – Deimos entrou na conversa e riu – Ela vai entender – disse com tom de
deboche e abaixou para falar algo no ouvido de Sky, que se despediu da mesa e
saiu correndo.
Fiquei
parado ali, sentado, esperando algo acontecer. Então Chloe levantou e disse:
–
Vamos Austin e Pedro, buscar a arma.
–
Arma? – perguntei ansioso. Já tinha visto filmes que se passavam no espaço e me
imaginei segurando um sabre de luz, ou uma espada que lançaria raios eternos.
–
Sim, a bandeira que os Estados Unidos fincaram aqui em 1969.
Saímos
da base e em poucos minutos, Chloe, Austin e eu estávamos andando pela
superfície rochosa da lua.
–
Estou tão animado! Uma viagem! – dizia ele.
Austin
e Chloe trocaram olhares de reprovação. Fiquei um pouco atrás dos dois,
esperando que eles pisassem primeiro, antes de mim.
–
Você sabe que você não pode ir – ela disse.
Se
eu realmente teria de ir naquela viagem, escolheria certamente Austin e um dos
irmãos. Deimos? Jamais. Sky não teria permissão, e Chloe já seria a pilota.
Lembrei-me de Lucy, a menina estranha da Base, anormal demais para uma jornada.
Andamos
por uns vinte minutos, até a curiosidade me deixar faminto. Perguntei:
–
Por que você não pode ir, Austin?
Ele
me olhou e depois fitou o céu.
–
Tenho irmãs me vigiando. Espionando de verdade, observando cada passo que eu
dou.
–
Você também é imperador de uma Lua? – continuei interrogando.
–
Quem dera – e ele riu – eu sou somente uma estrela que fugiu da minha
constelação.
Como
assim, Austin, aparentemente humano, uma estrela? As coisas tinham começado a
complicar novamente.
–
Você... uma estrela?
–
Não se espante, mas sim. Todos nós somos estrelas, mas estamos na fisionomia
humana por sua causa. Estamos falando sua língua materna por sua causa também.
Tivemos de aprender o português e usar por um bom tempo. Já houve descendentes
que eram alemães, foi muito difícil, ainda bem que ele foi morto – ele disse.
–
Estamos chegando – alertou Chloe.
–
Caso eu morra em batalha, virarei novamente uma estrela, e eu não quero mesmo.
Sou o quarto irmão mais brilhante da constelação de Orion, minhas irmãs sempre
me ofuscavam com seus brilhos e alinhamentos perfeitos, e fui obrigado a
deixá-las. Mas elas são traiçoeiras e o asterismo mais maldito de todo o
universo.
Tentei-me
lembrar de quando ficava apreciando o céu no Brasil. Estrelas brilhosas e
alinhadas... Três estrelas...
–
Você é irmão das Três Marias? – perguntei com dúvida.
–
Mintaka, Alnilan, e Alnitaka, Delta, Epsilon e Zeta, ou Três Marias. Mas sim,
sou – respondeu.
– E você Chloe? Também é uma estrela?
Ela
me lançou um olhar fulminante, o mesmo que Sky me lançara.
–
Não, sou desbravadora da Lua. Descobridora dos mares lunares. Irmã de Sky. Se
eu morrer, no máximo viro pó – disse.
–
E Deimos? O que ele é? – algo nele me deixava curioso. Ele era ignorante com
todos, ou só comigo? Algo no passado dele deveria ter deixado ele muito furioso
com todos, porque se chamava de traidor e tudo mais...
–
Deimos é complicado, vamos falar disso outra hora, porque estamos já na
bandeira.
Na
nossa frente, estava a bandeira mais polêmica que eu já tinha visto. Já tinha lido
na internet vários artigos comprovando que o homem nunca estivera a Lua, mostrando
o famoso argumento: a bandeira está tremulando! Odiava ler tudo isso porque
demonstra que ninguém tem fé na humanidade e no grande impulso que isso deu a
todos que estudam astronomia.
E
se alguém ainda acredita que o homem não pisou na Lua, prazer, meu nome é
Pedro.
–
Tá e o que iremos fazer com essa bandeira? Enfiar nos olhos dos alienígenas que
encontrarmos? – perguntei.
–
Você está brincando né? – perguntou Chloe, séria. – Isso é um acessório feito
de pó estelar, o material mais resistente do universo. – Ela retirou a bandeira
e ela se fez em pó em segundos.
Levantando
o acessório na mão, eu vi a coisa mais bonita do mundo. Brilhava intensamente e
as cores trocavam aleatoriamente. Era como uma pulseira, mas nenhum resquício
de pó encostava-se a outro, flutuavam como se seguissem uma linda corrente
colorida, formando direito uma circunferência.
–
É seu – ela disse e colocou em meu braço.
–
Mas para que serve? – perguntei admirando o meu primeiro acessório da galáxia.
–
Pó estelar, é o único resquício de ajuda em nossas missões. Ele controla o
tempo e espaço, os lixos espaciais, e além de se transmutar em o que você mais
precisar no momento.
Fiquei de boca aberta. Certamente esta era a
arma mais poderosa que eles tinham por ali e estava escondida em algo tão
simples, uma bandeira. Ficamos bons tempos ali, parados, admirando alguns
planetas. A terra parecia tão pequena olhando da Lua. Austin mostrou-me algumas
constelações que eu esqueci totalmente os nomes em questões de segundos.
–
Vamos ter um trabalhão para chegar próximo ao sol – queixou-se Chloe. – Vamos ter
que escolher passar por ao menos um planeta: Vênus ou Mercúrio antes de se
aproximar do Sol – lembrei-me de meu pai, que estava preso em Vênus.
–
Austin, cadê o número que você conseguiu? – perguntei interrompendo Chloe.
–
Já está desbloqueado a sua linha para ligações intergalácticas – respondeu.
Peguei
o meu celular, que continuava com 59% de bateria, e vi as ultimas ligações
atendidas. O Restrito que estava antes, havia mudado para um número totalmente
enorme. Liguei.
O
toque de ligação no universo é engraçado. É um barulho rápido e que finaliza
antes de você perceber. Você precisa ter uma audição muito boa para perceber
que tocou e que acabou.
Ninguém
atendeu.
–
Depois você liga – consolou Austin.
–
É, depois eu ligo – respondi.
–
Vamos Pedro, vamos dormir, acordaremos daqui a algumas horas para embarcar –
disse Chloe andando.
Andamos
de volta para a Base em silêncio. Chloe, a desbravadora, Austin, o irmão que
fugiu, e eu, o terrestre sem conhecimento do que estava se metendo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário