4 ✧ RODOPIOS
Experimente
pedir alguém para te jogar numa piscina enquanto você estiver dormindo, você
tem que ir até o fundo sem perceber que está debaixo da água, e só quando você
estiver boiando de volta para a superfície você acorda desesperadamente subindo
do nada.
Foi
assim que me senti quando o campo de gravidade da Lua foi atacado enquanto eu
estava subindo. Eu, a cama, e todos os objetos do quarto flutuaram
imediatamente. Abri o olho e a primeira coisa que fiz foi balançar os braços,
como um bebê aprendendo a nadar. Involuntariamente meu corpo virou e pegou
impulso, fui até o teto de cabeça para baixo. A luz branca do meu quarto virou
vermelha. Piscava.
Ouvia
gritos no corredor. “Estamos sendo
atacados”.
Atacados
pelo o que? Minha imaginação estava borbulhando em ideias. Extraterrestres,
monstros, planetas rebeldes, o quê?
Comecei
a gritar por socorro, mas ninguém me ouvia.
Eu
flutuava pelo quarto, encostando-se às paredes e no teto, fazendo impulso.
Tentei pegar impulso com os pés e me agarrar na cama, mas ela também girava.
Tateei a parede até chegar à porta do quarto. Chloe tinha dito para eu ficar
neste quarto, e dormir, porque quando ela acordasse, poderia me acordar sem
demorar muito para irmos.
Abri
a porta do quarto e dei de cara com o corredor cheio de pessoas flutuando.
Alguns estavam com armas brancas e outros flutuavam como se sempre fizessem
aquilo.
–
O que está nos atacando? – perguntei a um guarda aleatório que passou na minha
frente.
–
Caronte, a filha de Plutão – ele disse friamente.
Encontrei
Austin flutuando e ele estava desesperado. Agarrei-me a porta de uma sala e
fiquei estabilizado. Ele perguntava onde Sky e Deimos estavam porque eles
podiam impedir Caronte. Ele também me contou que estava lá fora e Caronte mais
uma vez estava atacando com seus gêiseres
e que não seria bom para ninguém sair da Base.
–
Alguma constelação o viu e fofocou para o universo todo, Pedro – confessou –
Tenho noventa e nove por cento de certeza que este ataque é por sua culpa, não
que você tenha que se martirizar, ache logo Chloe e vá!
E
assim fiz, como Austin não podia ir conosco por causa de suas irmãs, As Três
Marias, fui procurar Chloe, a pilota para irmos enquanto logo, não podíamos
esperar até o fim do ataque.
Entrei
no local onde estive pela primeira vez na Base, a maquete do sistema solar
flutuava livremente pelo teto e alguns teclados e mouses estavam presos em seus
computadores também.
Avistei
Haro e tentei nadar no ar para chegar próximo dele.
–
HARO! – gritei.
Ele
virou-se e vi que sua expressão não estava a das melhores. Ele parecia triste e
preocupado.
–
O que aconteceu? – disse aproximando-me. Ele levou as mãos aos olhos querendo
chorar.
–
Herbig foi... – disse e começou a chorar.
–
Calma Haro, Herbig foi aonde? – perguntei.
–
Foi sugado por um gêiser. Caronte está com ele – a voz dele soava frágil.
–
Vamos encontrá-lo. Estamos indo parar Plutão – prometi.
Ele
me olhou e fiquei meio sem graça. Como eu iria salvar o irmão dele? Tinha
acabado de chegar e já tinha feito uma promessa. E eu também teria de salvar
meu pai. Às vezes falar a verdade é melhor do que prometer algo vazio e que
você não sabe como cumprir.
–
Viu Chloe? – perguntei.
–
Estou aqui! Vamos! – a voz dela gritou atrás de mim – Mas antes, Haro, pegue o
kit de viagem e você, Pedro, pega a Placa Solar que está em cima da mesa!
Flutuei
até a mesa e peguei uma placa parecida com a que as mulheres de filmes usavam
para se bronzear na piscina. Vi Haro voltando com uma bolsa na mão, então
seguimos Chloe.
Entramos
por uma nova porta diferente, que dava para uma espécie de hangar, havia várias
naves quebradas, alguns maçaricos flutuando, mas o que me chamou atenção foi o
nosso ônibus espacial. Era branco e parecia um ônibus escolar americano, Chloe
informou que foi um presente dos Estados Unidos. Não tinha nada de mais, como
os dos filmes, que soltam fogo e possuem apetrechos. Entramos nele e tentamos
sentar. Era impossível ficar parado flutuando.
–
Quando que vamos parar de flutuar? – perguntei angustiado.
–
Assim que sairmos da órbita da Lua ou quando o ataque cessar, mas por enquanto
cale a boca, ninguém precisa lembrar que estamos flutuando – ela disse
duramente.
Chloe
sentou no banco do motorista e ligou o ônibus. Não precisou dar marcha nem
nada, somente apertou o acelerador e o ônibus começou a andar para frente.
–
Dirigir contra a gravidade é pior ainda – gritou Chloe desesperada.
– Você consegue! – encorajou Haro.
Chloe
não era uma péssima motorista, mas, porém ao sair do Hangar demos uma guinada e
o ônibus virou quarenta e cinco graus para a esquerda, quando ele voltou ao
normal balançamos um pouco e ele começou a subir e assim vimos Caronte.
Caronte
era parecida com um pequeno sol, de longe era vermelha e brilhava muito. Dela,
gêiseres brotavam e atacavam a pequena base. O gás que chegava à base batia no
metal e derretia-o. Vi alguns rostos conhecidos correndo com armas, lembrei-me
de Austin me dizendo: Tenho noventa e
nove por cento de certeza que este ataque é por sua culpa.
Chloe
perdeu a direção enquanto subíamos devido a um jato de gêiser surpresa que
bateu na janela do meu lado. Joguei-me no chão e o ônibus rodopiou no ar,
gritávamos e berrávamos. Chloe gritava meu nome:
– PEDRO! PEDRO! PARA ISSO POR
FAVOR!
Eu
não sabia o que fazer, aliás, nem carteira de motorista eu tinha, mas já estava
na idade de começar a tirar, mas agora no espaço é meio difícil treinar. O
ônibus continuava rodopiando pelo espaço e agora não estávamos mais perto da
Lua, mas continuávamos girando pelo vácuo.
–
PEDRO SEU INUTIL! – Chloe gritava.
–
O QUE EU DEVO FAZER? – respondi
berrando e acertei a cabeça no banco do ônibus, eu já sentia meu estomago
embrulhando, mas eu não havia comido nada até então.
–
BURACOS NEGROS ME ENGULAM! A BANDEIRA! A PULSEIRA! ACORDA! – clamava.
A
pulseira de pó estelar que era a bandeira fincada pelos astronautas americanos
em 1969. Sabia que ela era mágica e feita do pó que saía das estrelas, mas como
utilizaria? Tentei encostar, mas meus braços volteavam meu corpo e o mesmo
girava sem parar.
Por
fim, encostei com um dedo na pulseira, e senti algo diferente, como se minha
mente tivesse sido ligada naquele momento a aquele objetivo. O ônibus sofreu um
solavanco. O tempo ficou estranho, como se tudo tivesse parado por momento, se
o universo todo estivesse dando assistência à pulseira. Paramos no vácuo e fui
jogado para o teto e depois cai no corredor. Chloe estava com os cabelos em pé,
mas segurava fortemente no banco do ônibus e Haro estava a um fio de ser jogado
para fora no universo, segurando somente com alguns dedos na janela e o seu
corpo para fora.
–
Demorou muito para pensar, lerdo – e assim pisou no acelerador outra vez.
Continuamos
voando pelo universo enquanto Haro cantava umas músicas da Terra muito antigas,
perguntei-me como ele sabia daquilo.
–
Eu vi toda a guerra, foi legal, mas até hoje ninguém se tocou que o motivo todo
estava aqui no espaço. A Lua estava para ser atacada, então fizeram uma chacina
na Terra para ofuscar o real objetivo – dizia ele como se tudo isso tivesse
sido muito divertido.
Passou
algum tempo e realmente senti fome. Não comia desde que eu tinha saído da
Terra.
–
Tem algo para comer aí, Chloe? – perguntei.
–
Deve ter algo na bolsa – ela respondeu, mas ainda concentrada em dirigir. E eu
adorava a ideia, não gostei de rodopiar.
Peguei
a bolsa e fui retirando, havia uma bússola, um mapa enorme e lindo que mostrava
todas as estrelas do universo com direito a posição atual, havia uma grande luz
no canto direito do mapa se aproximando, brilhava muito, e eu achei a coisa
mais linda do mundo, e finalmente retirei tubos parecidos com pasta de dente
escritos “comida”.
O
gosto não era os melhores, aliás, não parecia nem ter gosto nenhum, mas engoli
dois tubos sem pestanejar. Sobraram nove, e me toquei que eles também deveriam
comer, então guardei.
–
Para onde vamos primeiro? – perguntei a Chloe, me aproximando dela.
–
Para Vênus, salvar seu pai – respondeu.
Tive
uma das visões mais incríveis da minha vida naquele momento. Em nossa frente à
escuridão tomava conta, mas estrelas faziam sua parte iluminando como vários
piscas-piscas no natal. Algumas rochas passavam próximos ao ônibus, mas Chloe
desviava com vigor. Estávamos em cima da Terra e uma linha verde pairava sob o
céu como se fosse uma linha de fogo: aurora
boreal, lembrei.
Voltei
para o banco e continuei admirando o espaço. Olhei para trás e Caronte
continuava na órbita da Lua, mas agora estávamos mais distantes, deixando tudo
para trás e só observando, Sky, Deimos, Austin, Lucy, os guardas, todos, indo o
mais longe possível, como covardes.
–
Por que não continuamos na Base para ajudar conter Caronte? – perguntei.
–
Não conteríamos – respondeu friamente Haro.
–
Mas por quê? Do mesmo jeito que Caronte é satélite de Plutão, a Lua é Satélite
da Terra. Sky está viva. – disse.
–
Por pouco tempo – a voz de Chloe soou seca e hesitante.
E
então percebi que o tempo de perguntas tinha acabado.
Estávamos
voando livremente pelo universo quando me toquei novamente que Haro estava
conosco. Ele tinha me dito que seu irmão havia sido sugado por Caronte, então ele
deveria estar lá, ajudando-o a se libertar do satélite malvado do meu tio
Plutão.
–
Haro, por que você não ficou para salvar Herbig? – perguntei.
Ele
levantou da cadeira de onde estava deitado e me encarou.
–
Caronte é um portal a Plutão, vocês estão indo para lá, e eu também. Sei que
ele ainda está vivo, consigo sentir – ele tocou o coração – e eu não posso
deixá-lo morrer, senão eu vou junto também.
–
Mas por quê? – imaginei que o amor que Haro sentia pelo seu irmão era algo único,
pois estava iria se sacrificar caso seu irmão morresse.
–
Porque nós ainda estamos nascendo e somos interligados. Um morre. O outro
também.
O
silêncio que o ônibus fez novamente foi matador. Certamente, neste momento
percebi que não conhecia a real história de quase ninguém e de que o universo era
algo enorme, mágico, e que nós humanos pensávamos que sabíamos de tudo, mandando
sondas e fazendo telescópios tirarem várias fotos – ou talvez eles saibam e não
divulguem.
–
Quando tempo estamos aqui, Chloe? – indaguei.
–
Pelas minhas contas, dois dias – ela respondeu e desviou de um sofá terrestre.
Era impressionante o quanto de objetos vindos da Terra estavam no espaço. Lixo
puro. – É o mesmo jeito que você conta na Terra, a única coisa que muda é que
como somos seres do universo, não sofremos o retardo.
–
O quê?
–
O retardo, sabe? Aquelas viagens demoradas pelo universo que os humanos fazem,
dizem que levam anos e mais anos para chegar a um local, e estamos quase em Vênus
em menos de quatro horas, temos esta vantagem. Aliás, o ônibus nos proporciona
disso, não te contei, mas as rodas deste são feitas do mesmo material de sua pulseira
– explicou.
–
Ah sim...
–
É, aquela que você não soube usar – falou rispidamente.
Depois
de um tempo viajando, Chloe e Haro lançaram um sinal sonoro de reprovação.
Olhei bem para frente e vi vários carros, ônibus espaciais – não do mesmo jeito
do nosso -, mas todos esperando a mesma coisa: um arco brilhante abrir.
Engarrafamento no universo, que
maravilha, pensei.
Havia
um arco enorme, brilhava com outro e parecia ser incrustado de estrelas novas
reluzentes, nas duas pontas duas cabines cinza flutuavam do mesmo jeito que os
veículos, os carros e ônibus paravam por um momento e depois eram liberados. O
do lado direito, eles ficavam pelo menos três segundos parados, o do lado
esquerdo – o que nós estávamos – quase três minutos. Ótimo.
Meu
celular vibrou, tomei um susto e levantei para atender.
–
Alo? – achei no fundo do meu coração que ouviria a voz do meu pai novamente.
–
Pedro! – a voz da minha mãe advertiu – Você está aonde?
–
Oi mãe! Hmm, eu estou... – lembrei-me de Deimos dizendo Ela vai entender – Estou no universo, mais precisamente em um
engarrafamento.
Ela
parou por um momento no telefone.
–
Tudo bem, Pedro, se cuida.
E
desligou.
Eu
estava muito preocupado sobre este momento, no qual eu teria de contar à minha
mãe sobre onde eu estava e o que eu estava fazendo, mas ela fora tão grossa
comigo que não quis nem saber de detalhes e nem ficou preocupada. Sabia que ela
escondia alguma coisa. Eu sabia.
–
Terminou a ligação? - Chloe perguntou.
–
Sim, por quê? – respondi.
–
Desligue o celular então, estamos próximos ao Pedágio do universo.
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